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sábado, 7 de junho de 2014

Sim, existe um Públio Lêntulus ao tempo do Imperador Tibério - nova versão

Amigos do Portal Saber,



Com muita satisfação publicamos, com a autorização de Carlos Henrique Nagipe Assunção, a mais completa e atualizada versão sobre o trabalho que trata da existência de Públio Cornélius Lêntulos, personagem do livro "Há dois mil anos", obra psicografada por Francisco Cândido Xavier.



Entre os vários acréscimos presentes neste texto atualizado, destacamos os fundamentos que explicariam o motivo pelo qual Públio Cornélius Lêntulus escreveu a carta ao Senado Romano descrevendo a pessoa de Jesus, questão assaz interessante para a análise dos estudiosos.



Boa leitura!



SIM, EXISTE UM PÚBLIO LÊNTULUS AO TEMPO DO IMPERADOR TIBÉRIO



Carlos Henrique Nagipe Assunção

Bacharel em História pela Universidade Augusto Motta





Resumo: O presente trabalho tem por objetivo a avaliação dos dados históricos contidos na obra “Há dois mil anos”, psicografada por Francisco Cândido Xavier. Propõe-se especificamente a busca de dados, em arquivos remanescentes da Roma Antiga, sobre a historicidade do personagem protagonista do livro em questão.


***

“Via-lhe os traços fisionômicos de homem idoso, sentindo minha alma envolvida na suavidade de sua presença (...) a generosa entidade se fazia visível a mim dentro de reflexos luminosos que tinham a forma de uma cruz (...) Levando suas dissertações ao passado longínquo, afirma ter vivido ao tempo de Jesus, quando então se chamou Públio [Cornélius] Lentulus.”[1]
Eis aí Francisco Cândido Xavier  - o famoso Chico Xavier -, ainda no início de suas tarefas mediúnicas, fazendo a devida apresentação daquele que lhe guiaria os passos: o Espírito Emmanuel. Foi criticado ou ridicularizado pelo simples fato de o seu guia ter declarado ser personagem romano. Imagina-se o furor causado na época diante de tal revelação! Se o leitor ainda não entendeu o porquê para tanto, convém mergulhar nas areias do tempo.

O personagem citado – Públio Lêntulus – já era conhecido e mencionado, há muitos séculos, nas tradições cristãs por conta da famosa carta em que descreve fisicamente Jesus:
“Eis aqui, enfim, a resposta que com tanta ansiedade esperáveis. Ultimamente apareceu na Judeia um homem de estranho poder, cujo verdadeiro nome é Jesus Cristo, mas a quem o povo chama ‘O Grande Profeta’ e, seus discípulos, ‘O Filho de Deus’. Diariamente contam-se dele grandes prodígios: ressuscita os mortos, cura todas as enfermidades e traz assombrada toda Jerusalém com a sua extraordinária doutrina. É um homem alto e de majestosa aparência; sua face, ao mesmo tempo severa e doce, inspira respeito e amor a quem a vê. Seu cabelo é da cor do vinho e desce ondulado sobre os ombros; e dividido ao meio, ao estilo nazareno. Sua fronte, pura e altiva, sua cútis pálida e límpida; a boca e o nariz são perfeitos; a barba e abundante e da mesma cor dos cabelos; as mãos, finas e compridas; os braços, de uma graça encantadora; os olhos azuis, plácidos e brilhantes. É grave, comedido e sóbrio em seus discursos. Repreendendo e condenando, é terrível, instruindo e exortando, sua palavra é doce e acariciadora. Ninguém o viu rir, mas muitos o tem visto chorar. Caminha com os pés descalços e a cabeça descoberta. Vendo-o à distancia, há quem o despreze, mas em sua presença não há quem não estremeça com profundo respeito. Quantos se acercam dele, dizem haver recebido enormes benefícios, mas há quem o acuse de ser um perigo para Vossa majestade, porque afirma publicamente que os reis e os escravos são todos iguais perante Deus.”[2]


Tal carta teria sido encontrada nos arquivos do Duque de Cesadini, em Roma e foi impressa pela primeira vez em 1474, em Colônia, por Ludolph the Carthusian, na obra “Life of Christ”. Discussões, porém, tendem a fazê-la muito mais antiga: há quem diga que é da época do imperador romano Diocleciano e outros lembram que Tertuliano, um dos Pais da Igreja Católica, faz menção a ela, no século II d.C. Para complicar um pouco mais a questão, existem pelo menos quatro versões diferentes, o que indica o dedo viciado humano, modificando certas coisas e detalhes em acordo com seus interesses próprios.

E a Igreja Católica, como se manifestou quanto a isto? Encontramos enciclopédias que deixam claro a posição da instituição:

“Públio Lêntulo: personagem imaginário, a quem se atribui uma carta apócrifa que descreve a pessoa de Nosso Senhor. Supõe-se que tivesse sido governador da Judéia antes de Pôncio Pilatos, e que ele tenha escrito a seguinte carta ao Senado romano. (…) A carta de Lêntulo é uma composição apócrifa: o seu caráter apócrifo é indubitável. Os copistas sequer sabiam que título dar ao seu pretenso autor; tal título variava na maioria dos manuscritos conhecidos; uns o chamam procônsul, outros governador, ou “praeses Hierosolymitanorum”, etc. Toda essa confusão decorre do fato de que nunca houve em Jerusalém ou na Judéia nenhum governador chamado Lêntulo. Houve um “praeses” ou ‘procônsul Syriae’, bem como um “procurator Iudaeae”. Mas nenhum procurador da Judéia jamais teve o nome Lêntulo. (…) Além disso, um romano nunca poderia fazer uso [em sua correspondência oficial] de muitas das expressões que ocorrem na carta, como “propheta veritatis”, ou “Filii hominum” – tratam-se de hebraísmos, e o último, inclusive, é retirado do salmo 44, vers. 3. A expressão “Jesus Christus” também revela um período [de composição] posterior, sendo tomada do Novo Testamento. Finalmente, sem levar em conta outros detalhes, pode-se observar que, se a carta tivesse sido escrita por um procurador da Judéia, não teria sido dirigida ao Senado, mas sim ao Imperador, porque a Síria, que incluía a Judéia [como sua esfera de influência] era uma província imperial, e não uma província senatorial. (…) Nenhum dos antigos escritores eclesiásticos mencionou a carta de Lêntulo, embora tenham muitas vezes citado os outros escritos apócrifos, conhecidos em seu tempo.”[3]
“Lêntulo, Públio: Hist., personagem histórico fictício, suposto governador da Judéia antes de Pôncio Pilatos. Atribui-se-lhe uma carta dirigida ao Senado e ao povo romanos, que cita a existência de Jesus e que fornece pormenores de seu aspecto físico e de suas qualidades morais, terminando com a afirmação de que Jesus era ‘o mais formoso dos homens’. A origem de tal documento é desconhecida; o certo é que foi impresso pela primeira vez na ‘Vita Christi’ de Ludolfo o Cartuxo (Colônia, 1474), e pela segunda vez na introdução às obras de Santo Anselmo. Nurembeg, 1491.[4]
“Públio Lêntulo é uma personagem fictício, supostamente um governador da Judéia antecessor de Pôncio [Pilatos], e que teria escrito a seguinte carta ao Senado romano referente a Cristo [segue-se o texto da carta, aqui não reproduzido]. A carta de Lêntulo é, com certeza, apócrifa: nunca houve um [magistrado com o título de] Governador de Jerusalém; nenhum procurador da Judéia teve por nome Lêntulo; um governador romano [da Judéia] não teria escrito ao Senado, mas sim ao Imperador, e não teria empregado expressões como ‘profeta da verdade’, ‘filhos dos homens’, ou ‘Jesus Cristo’. As duas primeiras expressões são hebraísmos; a terceira é tomada do Novo Testamento. A carta, portanto, mostra-se como uma descrição de Nosso Senhor, tal como a piedade cristã a concebeu.”[5]

Certamente, valeram-se dos registros conhecidos da família Cornelius Lentulus, uma das mais conhecidas e ilustres da Roma Imperial. Poderíamos citar vários, mas só no primeiro século d.C. temos:



- Gnaeus Cornelius Lentulus Gaetulicus e que foi Cônsul no ano 26 d.C.

- Cossus Cornelius Lentulus e que também ocupou o Consulado, mas no ano 25 d.C.

- Publius Cornelius Lentulus Scipio, Senador e Cônsul, cujo filho foi bastante respeitado na época do imperador Nero.

Esta família ocupou cargos importantes desde os anos mais remotos da República Romana. Há pelo menos uns cinquenta Cornélius Lêntulus conhecidos pelos historiadores atuais. Os citados nominalmente, acima, têm carreiras públicas bem conhecidas, o que permitiu concluir que nenhum deles esteve na Judeia do tempo de Jesus. Logo, a Igreja considerou o assunto bem resolvido.



Mas, eis que em meados da década de 30 do século XX, o jovem médium Xavier, de uma cidade pequenina de Minas Gerais, apresenta como guia o espírito que, repetimos, afirma ter sido este senador em existência pretérita, que fora legado imperial na Judeia e conhecera Jesus, quando de sua passagem pelo orbe.



A história específica deste personagem é publicada no livro “Há dois mil anos”, recebido pela psicografia em pouco mais de 2 meses. Longe de resolver a questão, o efeito, obviamente, foi o contrário: a fogueira ardeu mais intensamente: uns riram, outros vociferaram. Mas o fato é que aquele jovenzinho de pouquíssimo estudo, com rotina de trabalho intensa, dedicando-se já à prática do bem na Doutrina Espírita, recebera a saga completa de um mundo desaparecido há séculos, saga eternizada e reeditada até hoje.


A imprensa da época teceu uma série de comentários e que estão reproduzidos abaixo:
“Prosseguimos, hoje, na ‘enquete’ em torno das obras psicografadas por Francisco Cândido Xavier (...) Há dias um nosso entrevistado declarou, entre outras coisas, que Emanuel (guia espiritual do ‘médium’ mineiro) ‘se diz Públio Lêntulo, governador da Judéia no tempo de Cristo’; e que desse personagem não se vê ‘nem sombra’ naquela época, segundo dados de que dispunha.

O interesse que nos leva a abordar esse assunto histórico é o esclarecimento que devemos aos nossos leitores, que vêm acompanhando a presente ‘enquete’. E é por isso que, a propósito, fomos ouvir o sr. Silvano Cintra de Mello, cujas declarações reproduzimos a seguir.

Perguntamos inicialmente a S[ua] S[enhoria] [o sr. Cintra de Mello] se Emanuel, guia de Chico Xavier, disse ou não ter sido governador da Judéia quando fora [outrora] Publius Lentulus.”[6]
Prossegue o Jornal com a resposta de Cintra Mello, querendo esclarecer os fatos:
“Não , - respondeu-nos - Publius Lentulus foi senador romano e, por motivos de ordem particular, viveu por vários anos na Palestina. César confiara-lhe uma missão especial, talvez de caráter reservado, mas cuja finalidade, outra não era, senão a de justificar a sua ausência de Roma e facilitar-lhe a percepção de [subs]ídios.”

Em linhas gerais, podemos dizer que as críticas são as seguintes:

- Não haveria sentido algum no fato de um senador romano permanecer tantos anos em uma província;

- Não compreendem o cargo ocupado por Públio como Legado imperial, ainda mais quando se trata também de conciliar a missão com interesses particulares; 
- O Prefeito da Judeia (Pilatos) era um equestre (a segunda ordem mais importante de Roma, abaixo apenas da senatorial). Ora, Públio Lêntulus era um senador. Logo, era superior ao primeiro. Seguindo o raciocínio, Públio faria cair por terra a autoridade de Pilatos, ou seja, o que fosse decidido deveria ser acatado pelo Prefeito;

- O fato de Públio estar recebendo subsídios do Estado, o que, no entender dos críticos, seria feito apenas para adquirir honra, não havendo nenhum tipo de pagamento.



Destacamos os trechos do livro que serviram de base para algumas das críticas assinaladas, a fim de que o leitor entenda de maneira mais clara a situação:

“Poderias descansar um pouco na Palestina (...) Poderíamos harmonizar vários problemas do nosso interesse e de nossas funções (...) não me seria difícil obter dispensa do Imperador dos teus trabalhos no Senado, de modo a que continuasses recebendo os subsídios do Estado, enquanto permaneceres na Judeia”. – Flamínio Severus em sugestão ao senador Públio Lentulus. 
“(...) havia servido um ano na administração de Esmirna, de modo a integrar-se, da melhor maneira, no mecanismo do trabalhos do Estado, mas não conhecia Jerusalém, onde o esperavam como legado do Imperador, para a solução de inúmeros problemas administrativos(...)” – Pensamento de Públio Lentulus sobre sua situação.

“(...) se a decisão dependesse tão somente de mim, fundamentá-la-ia em nossos códigos judiciários(...)” – Públio, em resposta Pilatos, durante o processo de Jesus.[7]

Na verdade, nos perguntamos o porquê de certas críticas, cuja lógica parece saída de um míope em História e que quer julgar, de má-fé, os fatos em seu próprio interesse, desvirtuando-os da verdade, com o objetivo de fazer confusão. Ainda mais quando se acusa o respeitado médium de charlatão, mentiroso, um enganador que lia bastante e plagiou tudo o que escrevera. Por si só, isso já seria um fenômeno, levando-se em consideração o conjunto da obra, que já ultrapassa a marca de 400 livros, isso sem levar em consideração as inúmeras mensagens de espíritos a entes queridos que o procuravam sempre. Se a humanidade quiser buscar um entendimento para o fenômeno “Chico Xavier” deve ir noutros caminhos, porque creditá-lo de enganador é explicação bastante insignificante e insuficiente para responder a todos os fatos.



Fazendo nossas pesquisas corriqueiras, encontramos explicações importantes para a política administrativa romana do Império. Entre os magistrados (altos funcionários públicos) das vastas regiões do mundo antigo dominadas por Roma (províncias), havia dois tipos:



- Os menores (menos importantes);

- Os maiores (mais importantes, entre os quais se incluem os Proconsules, os Propretores e etc). 


Estudando os cargos provinciais maiores, um nos chamou a atenção em particular:
“Legados (legati) – Eram magistraturas que acompanhavam o governo nas províncias, os Proconsules e Propretores, na qualidade de seus lugar-tenentes (...) Além de coadjuvarem e substituírem os governadores das províncias no impedimento destes, eram os legados que julgavam as causas particulares, porque as públicas eram da alçada dos Proconsules e Propretores.
Algumas vezes foram nomeados os legados para governarem províncias pacificadas, tornando-se tão honrosa esta magistratura, que muitos cidadãos consulares e pretórios não se dedignaram [submeter-se a algo] de a pretender em Roma.


Os senadores que tinham negócios particulares nas províncias, pediam algumas vezes o lugar de legados honorários, para melhor serem atendidos e respeitados em terras estranhas; a isto se chamava legação livre.”[8]
“Os senadores, que tinham algum negócio particular (por causa dos quais se julgava não estarem ausentes da República), algumas vezes alcançavam do Senado uma Legação livre, isto é, decoravam-se com o nome e insígnias de Legado, para d’esta forma serem mais acatados por povos estrangeiros, e para poderem concluir com mais facilidade seus negócios.”[9]
“Entre cargos, um nobilis bem-sucedido tomava conta de seus interesses econômicos e vivia a vida social da aristocracia rural. Afastamento temporário dos negócios da res publica certamente não era incomum ou uma razão para a crítica.”[10]

A conclusão é óbvia a qualquer um, sem a necessidade de nos alongarmos tanto. Públio Lêntulus foi designado para um cargo especial e de interesse particular (do latim, Legatio libera), tal qual havia dito Cintra de Mello, em 1944. Fica evidente também o porquê de Públio Lentulus não intervir no processo de Jesus, pois este era um caso público. Seus poderes limitam-se aos casos privados. Não que Pilatos lhe fosse igual, mas exerciam funções diferentes. Mais interessante ainda é o fato de certos cargos provinciais serem mais honrosos, a ponto de não pretenderem nada em Roma, o que justifica os anos passados pelo senador em terras judaicas. Convém, ainda, considerar um outro fato importante: nos dias turbulentos do imperador Calígula, um familiar seu, Gneius Cornelius Lentulus Gaetulicus, fora executado a mando do próprio imperador. E quantos Cornelius não teriam sofrido perseguições na capital imperial no mesmo período! Ora, não seria melhor manter-se à distância?



Aprofundando as informações sobre o cargo de Legado honorário (ou Legação livre), certos detalhes surpreendem bastante:

"Então, senadores em países estrangeiros eram tratados com o maior respeito, [Cic. in Verr. iv. 11]. E, como os senadores não eram autorizados a deixar a Itália sem permissão (sinne commeatu), [Cic. Attic. viii. 15. Suet. Claud. 16. 23. Ner. 25.] a menos para a Sicília e a Gália Narbonense [Dio. liii. 42.] quando tinham a oportunidade de viajar para o exterior, eles geralmente obtinham o privilégio de uma legação livre, como era normalmente chamado (sine mandatis, sine ullo reipublicae munere; ut haeritates aut syngraphas suas persequerentur,), [Cic. de Legg. iii. 8. Ep. Fam. xi. 1. Att. xv. 12. Suet. Tib. 31.] que lhes dava o direito de serem tratados, em todos os lugares, com as honras de um embaixador. Na província, eles tinham lictores para atendê-los [Cic. Ep. Fam. xii. 21]”.[11]

“Sempre que eles viajaram para o exterior, mesmo a respeito de seus próprios negócios, eles foram mantidos sob custeio público, e sempre encontravam provisões para si e seus atendentes, prontamente preparados para a estrada; um privilégio que foi geralmente denominado legação livre."[12]

Qualquer indivíduo que tenha lido “Há dois mil anos” encontrou impressionantes paralelos com a citação acima e que, tal a importância, destacamos abaixo:

“Esperavam-no, além do legado do Procurador, alguns lictores e numerosos soldados pretorianos, comandados por Sulpício Tarquínius, munido de todos os aprestos e elementos exigidos para uma viagem tranquila e confortável pelas estradas de Jerusalém.”[13]

“Senador, não só como responsável pela situação dos patrícios na província(...) Acabo de designar Sulpício, homem que me merece inteira confiança, para dirigir os serviços de segurança que vos são devidos. Além dele, mais um lictor e alguns centuriões partirão para Cafarnaum, onde permanecerão às suas ordens.”[14]

“Encarava com ansiedade os primeiros obstáculos à sua permanência na Judeia, na qualidade de patrícios, mas também como estrangeiros.”[15]

“Não devemos esquecer que Públio permanecia na Palestina com poderes amplos, na qualidade de emissário de César e do Senado, e a quem todas as autoridades da província, inclusive o governador, eram obrigadas a acatar com especial atenção e máximo respeito.”[16]

“Públio Lentulus continuava comissionado na Palestina, onde gozava de todos os direitos e regalos políticos, na administração imperial.”[17]
Era muito comum que o Legatio libera exercesse também o Legatio votiva, o que lhe dava, conforme citado anteriormente, honras de embaixador. Assim, Públio Lêntulus representaria também os interesses de Roma junto à nação conquistada, explicando-se, assim, a razão de indivíduos do povo o procurarem para denunciar as ações violentas de Pilatos. Compreende-se também porque se envolveu, segundo o livro “Há dois mil anos”, na reforma administrativa da província, o que deve ter ocorrido nos primeiros anos da década de 40 de primeiro século, quando, segundo a História, não havendo mais prefeitos romanos, foi implantada a monarquia, sob o rei Herodes Agripa I, sendo substituída, poucos anos depois, pela administração de procuradores nomeados pelo próprio imperador.



Convém, igualmente, destacar a questão referente ao subsídio, a fim de que refutemos todas as críticas lançadas. Públio recebia ou não pela missão de seu cargo? O trecho abaixo poderá fazer cair por terra qualquer dúvida:

"Tudo valia dinheiro. Os postos militares que garantiam a polícia dos campos e ali preenchiam os cargos administrativos faziam os povoados votar-lhes gratificações. (...) Um romano enriquecia em parte à custa dos cofres públicos(...)”[18]

“Ninguém servia o Estado, porém dele se servia.”[19]

Tal fato não era diferente para o Legatio libera, sendo que os subsídios que recebia vinham do cofre da província em que estava estabelecido. Isso, sem dúvida alguma, deve tê-lo tornado uma figura bastante indesejada entre a população provinciana.



Há outro ponto sobre o qual devemos também nos debruçar. Emmanuel informa, no livro em comento, que era senador romano já no ano 31 d.C., quando tinha por volta de 29 ou 30 anos de idade. A crítica também questiona esse trecho, afirmando tal ser impossível, pois o personagem não tinha a idade mínima para ingressar nesta instituição. Indagamos, mais uma vez, sobre a fonte que permitiria tal indagação, vez que, de acordo com o nosso conhecimento, não há nenhum erro no fato. Vejamos as condições para fazer parte do Senado:

“ 1 – Que tivesse servido em algum cargo, pelo menos a questura, para o qual se exigia a idade mínima de 25, sendo por isso indispensável que o candidato tivesse 26 anos.
2 – Renda mínima de 800,000 sestércios, que no tempo de Augusto foi elevado a 1.200,000 (...).

3 – Que tivesse comportamento irrepreensível.”[20]

 “Em terceiro lugar. Atendeu-se ao censo, que nos tempos mais remotos parece ter sido pequeno, mas florescendo a República foi de 800 asses. Porém, Augusto ordenou que o censo dos senadores fosse de 1.200 asses. Em quarto lugar, se atendeu à idade, mas qual esta fosse, não se sabe ao certo, é porém natural que exigisse a de 25 anos.”[21]

Assim, a conclusão, sem delongas, é óbvia: Públio, com seus 30 anos de idade, poderia sim ter sido senador romano, não havendo motivos para críticas em torno disso. 



Apesar destas conclusões positivas e que nos levam a considerar com apreço o romance de Chico Xavier, continuávamos a nos perguntar se tal personagem não existira de fato para a História, se não nos chegara nenhum registro de tal patrício do primeiro século da Era Cristã. À princípio, debruçamo-nos sobre as biografias dos Cornélius Lentulus conhecidos no 1º século. Nenhum deles, repetimos, adequa-se ao perfil apontando em “Há dois mil anos”. Mas, posteriormente, descobrimos as chamadas “Prosopographia Imperii Romani”. Pelo menos duas obras foram lançadas com este nome: uma de Elimar Klebs, Paul von Rohden e Hermann Dessau, de 1897. Outra, de Edmund Groag e Artur Stein, igualmente do século XIX. Ambas em latim. Os livros reconstituem carreiras políticas dos romanos conhecidos nos três primeiros séculos da era cristã. Encontramos todos os Cornélius conhecidos, mas nenhum senador chamado apenas Públio Cornelius Lentulus, vivendo no primeiro século d.C.



Concluímos, neste momento, que os estudiosos católicos do pretérito se utilizaram das “Prosopographias” para achar qualquer indício do senador que escrevera a carta acerca da aparência de Jesus. Possivelmente, procuraram também na lista dos cônsules romanos. Eram dois a ocuparem simultaneamente os cargos tão honrosos. A lista (Fasti Consulari) está no Museu Capitolino, em Roma. Vários Cornelius são mencionados nela, mas nenhum Publio Cornelius Lentulus no período em questão. No entanto, descobrimos uma mais específica, contendo também os Cônsules suffectus, que nada mais eram do que cônsules substitutos, em caso de morte ou renúncia dos oficiais. Ali, sim, no ano 27 d.C. há citação a um nome que nos chamou a atenção: 


1 Cônsul suffectus – Publius Cornelius Lentulus
2 Cônsul suffectus – Sallustius Crispus Passienus



Portanto, podemos afirmar, com muita propriedade, que existiu um Publio Cornelius Lentulus na época em destaque, patrício romano que estava iniciando sua carreira política no governo do imperador Tibério. 



Quanto ao primeiro, o foco da nossa investigação, nenhuma informação biográfica. O segundo era jovem ainda, tendo somente casado anos depois de ter ocupado o cargo. Logo, concluímos que haveria uma fonte primária e que era preciso chegar a esta. Assim, livros do séculos XVI foram consultados; livros dos séculos XVIII, também. 



Mas foi na seguinte obra do século XIX que começamos a encontrar a resposta: Fasti Consulares Inde a Caesaris Nece Uesque ad Imperium Diocletiani, obra em latim, de Iosephus Klein, datada de 1881.



No livro, o autor destaca o Cônsul suffectus, fazendo uma pequena explicação que, a nosso ver, foi o motivo deste indivíduo ter sido ignorado pela História. Está assinalado da seguinte maneira os nomes de ambos, na página 26:


P. [Cornelius] Le[ntulus?]
C. Sall[ustius?]


Ao lado deste trecho, figura uma nota indicando a fonte onde fora encontrada a nota: Fasti Arvarium.


Os Acta ou Fasti Arvalium são as atas de registro de uma fraternidade sacerdotal da antiga religião romana dedicada à Dea Dia, deusa dos bosques e da fertilidade do solo, por vezes identificada com Ceres. Seu Templo ficava na margem direita do Rio Tibre e todo mês de maio ocorria a Ambarvalia, festival em sua homenagem. Confira-se as seguintes imagens:









Fragmentos dos Fasti Arvalium – La Magliana, Roma (https://hcmc.uvic.ca/grs/mdb/search.php?q=&page=541 . Acessado em 15/01/2014 às 15:13)



Os registros dos sacrifícios ficavam grafados em placas de mármore nas paredes do Templo e em 1866-1869 começaram a ser descobertos por Wilhelm Guil. Henzen. Posteriormente, o material foi reunido no livro Acta Fratrum Arvalium, publicado pelo citado historiador, em latim, no ano de 1874, na cidade de Belrim. Na página 457, acha-se assim explicado o personagem em questão:

“p. [cornelius] le[ntulus?] cônsul suffectus com c sall[ustio] a. 27 fasti mag: mas não é claro saber se, na verdade, Lentulus existiu tal como declarado.”[22]

Para os que não estão familiarizados com a convenção da nomenclatura da Roma Antiga, são necessárias algumas explicações.



Os nome do indivíduo romano era constituído de três elementos: o prenome, o nome da gens (ou seja, da tribo a que pertenciam, sendo este o mais valorizado, o verdadeiro nome) e o cognonem. Por vezes, aparece também o agnomem.



Alguns perguntarão como uma simples abreviatura como “P.” levou a conclusão de que se trata de um “Públio”. Não poderia ser outro nome? Não! De acordo coma convenção da época, seria mesmo esse nome. Na verdade, era comum o prenome figurar abreviado nos monumentos públicos. Os exemplos abaixo, todos Publius da Antiga Roma, deixam isso claro:






Inscrição honorífica a Públio Élio Coerano – Museus do Vaticano (http://ancientrome.ru/art/artworken/img.htm?id=3567 . Acessado em 15/01/2014 `as 16:39)








Monumento funerário da família de Públio Géssio – I século a.C. 
Acessado em 15/01/2014 às 16:03)



Monumento da família de Públio Géssio – detalhe (http://www.vroma.org/images/raia_images/tombstone_gessius5.jpg . Acessado em 15/01/2014 às 16:30)



Urna funerária de Públio Nónio Zethus – Museus da Vaticano (http://www.vroma.org/images/raia_images/tomb_Zethus2.jpg . Acessado em 15/01/2014 às 18:34)




Busto de Públio Cornélio Cipião – Vila Borghese – Roma (http://www.flickr.com/photos/quetzalcoatl1/9368543717/ . Acessado em 13/01/2014 às 20:38)

Em seguida, está escrito [cornelius], o que indica que foi acrescentado o nome gentílico, por tratar-se do correto. O uso de nomes entre colchetes é muito usado, no livro, para vários indivíduos cujos nomes estão fragmentados.

Por fim, há o [Le?]. Não encontramos nenhum ramo dos Cornelius cujas inciais “Le” fossem de qualquer outro que não o dos Lentulus. Na verdade, Lentulus era, no primeiro século d.C., um cognomem exclusivo desta gens e de nenhuma outra. Alguns poderão até mesmo querer sugerir outros cognomes de famílias importantes da época, mas convém observar algumas questões:

- O organizador do ‘Fasti Arvalium’ não renega a fonte histórica, cujo conteúdo em questão aparece fragmentado. Fazer isso seria um contrassenso, uma desvalorização de sua própria obra. Ao pôr na nota de rodapé: “mas não é claro saber se, na verdade, Lentulus existiu tal como declarado” refere-se ao fato de não haver nenhum outro registro da vida política deste personagem que não seja o único citado. Mas isto, de maneira alguma, quer dizer que esta carreira inexistiu. Demonstra apenas que ela não chegou a nós. Forçoso é reconhecer que na parede de um templo romano foi grafado o nome de um Cônsul suffectus chamado Publius Cornelius Lentulus e que ninguém, até onde pudemos pesquisar, prestou a atenção neste homem.

- As famílias tinham a tendência de usar os mesmos prenomes de seus antepassados. Logo, há um número limitado no meio destas. A gens Aemilia, por exemplo, usou regularmente através dos séculos Lucio, Manio, Quinto, Tibério, Caio e até mesmo Paulo. Na gens Cornelia, numerosos indivíduos foram chamados de Publius. Não encontramos nenhuma família importante o suficiente para que um dos seus membros ocupasse o cargo citado, cujo nome Publius fosse utilizado e cuja a sílaba “Le” iniciasse um cognomem.

- A época está repleta de Cornelius Lentulus que ocuparam o Consulado. No ano 24, Publius Cornelius Lentulus Scipio foi eleito para o cargo. Em 25, foi a vez de Cossus Cornelius Lentulus. Em 26, veio Cneius Cornelius Lentulus Gaetulicus. É lógico pensar que, pela fama e poder da gens, um outro membro seu tenha ocupado o Consulado em 27 d.C.

- O autor da obra complementa, afirmando, que este Publius é um Cornelius. Se ele tivesse qualquer outra família como potencialmente provável, ou ele deixaria clara a dúvida, assinalando a questão, ou simplesmente deixaria em branco, o que é comum em vários trechos do Acta, o livro lançado no século XIX, com relação a outros indivíduos. 

- Até onde pudemos identificar, não existe na academia questionamentos sobre a correlação deste específico registro epigráfico com o nome Publius Cornelius Lentulus.

Era muito comum que os patrícios ocupassem o cargo de cônsul suffectus até os trinta anos de idade. Mais do que isso: era uma maneira de possibilitar, de permitir que o indivíduo exercesse cargos importantes administrativos, tais quais os variados tipos de Legado, nas províncias da Ásia e da África. A necessidade de ter indivíduos para o preenchimentos de Legados provinciais, levou o imperador Augusto inclusive a reformar o Consulado suffectus. 

Muitos poderão argumentar que a idade mínima para a função era a de quarenta ou quarenta e três anos. Entretanto, tal era o costume da época republicana e o período em questão é o imperial. Aqui essa pré-condição, na prática, foi caindo por terra, levando-se em consideração que muitos imperadores se autodenominavam ou indicavam protegidos seus para o cargo bem antes do tempo permitido. Assim, Otávio Augusto foi Cônsul aos dezenove anos. Caio César ocupou-o por volta dos vinte anos de idade. Marcus Furius Camilo tinha por volta de trinta e três primaveras quando foi nomeado para o ilustre cargo, no ano 8 d.C. O próprio companheiro de Publius Cornélius Lentulus, o suffectus Sallustius, nem havia casado ainda, conforme afirmamos anteriormente. Isso para citar somente alguns exemplos.

O cargo de cônsul era o último de uma série de outros que deveriam ser ocupados pelos jovens patrícios. A isto se chamava cursus honorum (carreira ou curso honroso). Com vinte anos de idade, poderia ser tribuno militar (tribunus laticlavius). Depois, ocuparia sucessivamente o cargo de questor (responsável pelos impostos e finanças), edil (manutenção da ordem e abastecimento da cidade) e pretor (responsável pela Justiça). Mas não se deve entender essa ciclo como absoluto. Muitas famílias patrícias conseguiam subtrair os cargos de tribuno e de edil de seus jovens, assim como o intervalo de tempo exigido entre as funções. Ademais, repetimos, a vontade do imperador vigorava sobre todas estas convenções, pouco importando idade mínima e outros fatores. A obra “Há dois mil anos” nos dá a informação de que o senador Lentulus 
“conhecera parte da Ásia, porque, na primeira juventude, havia servido um ano na administração de Esmirna, de modo a integrar-se, da melhor maneira, no mecanismo dos trabalhos do Estado”[23]
É muito claro que ele faz alusão ao seu ‘cursus’, devendo-se considerar um detalhe importante: na maioria das vezes, este era o tempo de duração das magistraturas da carreira em questão. Mas que cargo específico teria ocupado?

Se levarmos em consideração o termo “primeira juventude” como alguém bem jovem, é possível aventar, sobretudo, um cargo inicial citado por Marrecas no livro “Antiguidades romanas”. Este cargo é o de Contubernales, em que jovens do patriciado, algumas vezes, acompanhavam procônsules e propretores “para aprenderem nas províncias os exercícios da guerra” (p. 68); 

O cargo de questor provincial (quaestor provincias) é outra possibilidade, muito embora a idade mínima para tal (vinte e cinco anos, na fase imperial, podendo ser subtraído em dois anos) não nos permita dizer que foi exercida na ‘primeira juventude’. Suas funções eram a coleta de impostos, pagamento dos funcionários do governo e das legiões romanas, sendo a principal autoridade depois do governador da província. 

Não há notícias de legiões romanas na Ásia Menor nos anos 20 do primeiro século d. C., o que exclui o fato de ter sido ali tribuno militar.

Convém lembrar que, depois de terminado o mandato de questor no início do cursus honorum, o indivíduo patrício tornava-se membro do Senado Romano, se estivesse em acordo com as condições já explicitadas.

Emmanuel teria deixado rastros que nos induzem a concluir que teria sido o consul suffectus apontado no Acta Arvalium? Primeiramente, devemos esclarecer que havia dois tipos de senadores: os pretórios, que só tinham ocupado, no cursus honorum, o cargo de pretor e os consulares, que tinham chegado a função máxima do cursus: cônsul. Estes tinham, ao longo da vida política, uma série de privilégios que, segundo Dr. João Henrique, em seu livro sobre as instituições da antiga Roma , incluía até mesmo os festejos públicos:
“A ordem de precedência manifestava-se nos lugares dos assentos. Também nos teatros [e nos espetáculos públicos, em geral] tinham, por lei, postos [lugares] de honra.”[24]
Ora, um dos episódios mais conhecidos da obra “Há dois mil anos” é a comemoração no Circus Maximus, em Roma. Lívia está na arena, sendo atacada por leões e Públio Lêntulus, do alto, assiste a cena, sem atinar para a gravidade do momento sobre o seu destino. Assim, entende-se porque o personagem está na tribuna de honra, ao lado do imperador Nero, em meio aos festejos. Era um direito dele, dada a condição de ex-cônsul, ainda que suffectus!

Logo, todo o conjunto se liga: o jovem senador Públio Lentulus (do “Há dois mil anos”) foi esse suffectus, o que lhe possibilitou ser nomeado Legado honroso na província asiática, de acordo com interesses particulares, inclusive. E, ocupando um dia o consulado, gozou de certos privilégios vitalícios que tal cargo proporcionava. É impossível não notar como as informações, a histórica e a psicografada, se completam plenamente, apresentando um contexto de notável verossimilhança.

Para concluirmos a nossa abordagem, falaremos agora do motivo inicial que nos levou a pesquisa: existiu mesmo uma carta de Públio Lêntulus descrevendo Jesus? A obra ‘Há dois mil anos’ fala algo sobre este ponto? Vejamos o seguinte trecho do livro em questão:
“Escreveu-lhe (Públio Lentulus) longa carta, em suplemento, com vistas ao Senado Romano, sobre a personalidade de Jesus-Cristo, encarando-o serenamente, sob o estrito ponto de vista humano sem nenhum arrebatamento sentimental.”[25]
Conhecendo as versões diversas e levando em consideração o que o próprio Emmanuel afirmou acima, é possível concluir que existiu, sim, uma carta, que devia fazer parte de uma série de outras descrevendo possíveis indivíduos com potencial ou não para insuflar rebeliões, acrescentando ainda questões religiosas aos fatos.

Questão relevante radica no fato de que a carta, e suas várias versões, estão cheias de termos que jamais um senador usaria. Frases como: “um homem, que vive de grandes virtudes”, “em verdade, a cada dia ouve-se coisas maravilhosas sobre este Jesus”, “Diz-se que um tal homem nunca foi visto por estas paragens”, “é o mais belo homem que se possa imaginar, muito semelhante a sua mãe”, “Filho de Deus”, obviamente foram acréscimos posteriores, conforme já dissemos. Sobre este assunto, basta prestarmos a atenção na fala do próprio autor para percebermos que, de maneira bastante sutil, ele vai ao encontro do nosso pensamento sobre a questão. Aqui, ele apresenta uma explicação verossímil que responde às principais críticas lançadas contra as versões da epístola que chegaram até nós. A exata pertinência do comentário de Emmanuel em destaque demonstra conhecimento específico digno de um especialista na Epístola Lêntulus.

Muitos ainda se indagarão sobre uma questão crucial: seria válido a um patrício romano escrever ao Senado sobre a personalidade de Jesus? Por que os senadores se ocupariam com aquele carpinteiro de Nazaré? Existiria um motivo relevante para tanto? Muitos responderam ao longo dos tempos que não, que isso carece de lógica e que a História da época em que o Cristo viveu, ignorou a sua existência. Mas nós pensamos o contrário! Se nos aprofundarmos na religião romana e nos atermos a um ponto específico, encontramos uma resposta inquestionável e positiva para tal: 
"Na verdade, os deveres religiosos realizados pelos cônsules durante as primeiras semanas no cargo estavam entre suas funções mais importantes. A religião romana era nacional e cívica e sua prática era uma questão política, uma vez que era concernente a toda a civitas. A maioria das atividades religiosas eram realizadas em público, de acordo com regras estritas, e seu principal objetivo era manter ou restaurar a pax deorum [paz dos deuses]. Havia especialistas agrupados em vários colégios sacerdotais que serviram como consultores qualificados essenciais, mas a gestão dos assuntos religiosos encontrava-se nas mãos do Senado e para a manutenção da relação direta entre a comunidade e os deuses foi atribuída aos magistrados, em especial para os cônsules como magistrados supremos da civitas. (...) O principal dever religioso dos cônsules ao assumir o cargo era o de lidar com a expiação de todos os prodígios que ocorreram em Roma e na Itália durante os meses anteriores. Para a mentalidade romana, prodigia incluía todos os fenômenos considerados sobrenaturais ou misteriosos. Eles eram vistos como uma expressão terrena da ira dos deuses. Assim, o prodígio geralmente significava que a pax deorum tinha sido violada por alguma ação humana inadequada, ou expressava um aviso para o futuro. As contravenções cometidas, ou os erros realizados por cidadãos não eram de natureza exclusivamente privada. Pelo contrário, eles tiveram um impacto sobre a comunidade e colocavam em risco sua própria existência. Era, portanto, necessário restabelecer o relacionamento adequado entre a civitas e os deuses de Roma por meio de cerimônias de expiação apropriadas. Tal tarefa só poderia ser realizada pelos magistrados, que eram os representantes dos cidadãos e que poderiam, assim, legalmente e legitimamente agir em seu nome. Prodígios podiam ser observados por qualquer indivíduo, quer seja um simples cidadão, um sacerdote ou um magistrado. Em princípio, uma vez que significava uma alteração no curso normal dos acontecimentos, um prodigium representava um perigo. Mas a mera observação de um fenômeno considerado sobrenatural não era suficiente para que pudesse ser considerado automaticamente um prodigium. Para este propósito era essencial que o Senado o reconhecesse como tal, para a sua expiação envolver o Estado. Por esta razão, todo os alegados prodigia que ocorreram durante um determinado ano eram compilados para que um dos novos cônsules, seja no primeiro dia que assumiu o cargo ou imediatamente depois, pudesse trazer uma lista de prodígios perante o Senado. O cônsul produzia seu relatório em nome do povo, e incluía todos os dados recolhidos em cada um dos fenômenos. Se ele julgasse conveniente, poderia até mesmo complementar a relatio com a introdução, perante o Senado, de testemunhas oculares das ocorrências. Os senadores, então, decidiriam se os eventos descritos poderiam, de fato, ser considerados como presságios enviados pelos deuses, isto é, como prodigia.Uma vez que as deliberações terminavam, o Senado emitia o correspondente decreto. Apenas então os supostos sinais divinos oficialmente tornavam-se prodigia.O senatus consultum também incluía a resposta a dar aos deuses pela civitas. Se os prodígios já eram conhecidos ou mesmo se eles eram frequentes e considerados como sendo não tão importantes, os senadores imediatamente iriam ordenar cerimônias expiatórias. Estas eram confiadas aos cônsules, que poderiam, então, decidir sobre a forma específica dos rituais a serem celebrados em honra aos deuses, como Tito Lívio às vezes enfatiza. No entanto, se os prodígios eram desconhecidos, ou se eles eram considerados particularmente graves, o Senado decidiria consultar os especialistas: pontífices, áugures, responsáveis pelos livros sibilinos ou arúspices - o Senado iria para apenas um desses grupos sacerdotais ou a dois deles em conjunto. Ao receber uma resposta, o Senado reunia-se novamente para lidar com a questão e, em seguida, encomendava as cerimônias de expiação que haviam sido recomendadas. Como no caso anterior, os cônsules estavam encarregados dos sacrifícios.No procuratio prodigiorum havia, portanto, uma clara divisão de papéis: qualquer cidadão podia denunciar ou dar um aviso; só o Senado poderia decidir se ele era de fato um caso de presságios divinos dignos de serem levados em consideração e, portanto, determinar como reagir; só os cônsules podiam, em seguida, dar a resposta adequada exigida pela divindade, a fim de alcançar a pacificação da relação entre os deuses e os romanos. (...) (...) qualquer prodigium potencial significava uma violação da pax deorum” [26]
Concluindo o nosso pensamento de acordo com as ideias expressas no texto acima, é óbvio que, estando na Israel do início do século I d.C., os cidadãos romanos, incluindo o próprio Lêntulus, ouviriam falar de um homem chamado Jesus e que este curava inúmeras pessoas, chegando até mesmo a ressuscitar os mortos (segundo pensamento da época), que “andava’ sobre as águas, que prometia um Reino celestial que não é da Terra e que reuniu em torno de si vários discípulos. Este homem poderia ser considerado um prodigium e, assim sendo, qualquer um tinha competência para relatá-lo aos senadores, em Roma. Esse detalhe é também digno de ser comentado, já que muitos questionaram o fato de Públio Lêntulus, que devia seu cargo ao imperador, escrever a famosa epístola ao Senado. Ora, o autor do texto deixa claro que esse era um assunto do Senado. Ademais, no início do Império, em que os principais cargos administrativos ligados diretamente ao imperador eram dados a escravos libertos, um membro da classe senatorial dirigir-se tão diretamente ao César poderia mostrar um certo grau de subserviência, o que não deixaria uma boa impressão enquanto homem público. 

O que julgou o poderoso e respeitado Senado de Roma acerca do Cristo? Não sabemos. Emmanuel silencia. A História silencia. Lamentavelmente, nada concreto chegou aos nossos dias.

Interessante ainda o fato de Emmanuel, no livro “Há dois mil anos” mencionar o aspecto crístico em questão:
"A figura patriarcal do velho Simeão, da Samaria, porém, destacava-se a seus olhos entre todos os que a receberam com as mais elevadas demonstrações de carinhosa bondade. Do seu olhar profundo e das cãs veneráveis emanavam as doces irradiações da maravilhosa simplicidade do antigo povo hebreu, e a sua palavra, ungida de fé, sabia tocar os corações nas cordas mais sensíveis, quando narrava as ações prodigiosas do Messias de Nazaré.” [27]
Ainda não se sabe nada acerca da vida deste indivíduo citado no Acta Arvalium, o que não significa que, futuramente, não surjam novidades neste sentido. Existem muitas passagens de tempo no livro “Há dois mil anos”, em que o autor espiritual não nos deixa qualquer informação sobre sua posição política e econômica. Isto abre um leque de possibilidades para que se descubra o personagem aqui analisado, a exercer inúmeras funções nas províncias do vasto Império Romano; ou , quem sabe, na própria Roma.

Diante de todos os apontamentos feitos ao longo do texto, muitos se indagarão por que personagem tão ilustre e importante não fora citado pelas fontes escritas que narram a História do primeiro século em Israel.

Graças a Flávio Josefo, judeu posteriormente adotado pela família imperial dos Flávios e escritor de ‘Antiguidades judaicas’, ‘Contra Apião’ e ‘Guerra dos judeus’, conhecemos os nomes de importantes administradores das áreas citadas, quando do século 1 d.C. Além disso, ele também tomou parte na primeira revolta, em que judeus, cansados e desiludidos, resolveram lutar para se libertar do domínio romano. Tal fato é um dos episódios principais do primeiro romance de Emmanuel, onde é relatado que o senador Lentulus participara do conselho de guerra do próprio Tito. Ora, qualquer indivíduo que tenha lido sobre a rebelião, tal qual narrada nos livros primeiramente citados, percebe a preocupação intrínseca de Josefo em mostrar que a nação judaica sofrera tal castigo por conta de seus pecados e que foram abandonados por seu deus. Em contrapartida, a Fortuna (deusa romana da sorte e da esperança) estivera ao lado dos romanos o tempo todo, o que ajuda a esclarecer o motivo da vitória destes. A deusa é citada várias vezes ao longo da narrativa. Sabemos também que o autor não escreveu suas recordações acerca deste episódio histórico de maneira imparcial, já que desejava agradar a família que havia lhe adotado: a dos próprios imperadores flavianos do período. Acrescenta-se, ainda, o fato de os romanos procurarem apagar as tragédias e personagens, de alguma maneira desgraçados, da sua História. Pompeia e o imperador Nero são grandes exemplos disso. Dentro desse contexto, escrever que um senador dos mais ilustres, membro de uma das famílias mais tradicionais e importantes de Roma, fora simplesmente capturado por uns “míseros e insignificantes” judeus, que lhe cegaram e só não o executaram porque não o quiseram, seria um golpe muito grande ao orgulho romano. Mais ainda! Feriria a baseda ideologia imperialista e hierarquizada de Roma, pois que mostraria que um dos seus maiores representantes era um mero homem e que, como tal, poderia sangrar e morrer. Por outro lado, encorajaria os súditos das províncias, provando que mesmo um insignificante ser da mais remota de suas províncias poderia se elevar e vencer aquela aristocracia que, orgulhosa, se punha sobre um pedestal e decidia os destinos do mundo. Soma-se a isso o fato de que um romano de futuro promissor (Marcus Cornelius Lentulus) fora simplesmente escravizado e criado como um joguete nas mãos de um judeu obscuro.Narrar que um simples centurião ou um soldado morrera na batalha é aceitável (ainda assim, exalta-se sobremaneira a coragem destes), mas o mesmo não ocorre para um patrício. Assim, pensamos, há uma ampla possibilidade do Josefo ter retirado quaisquer referências ao Publius Cornelius Lentulus quando de seus escritos, como se o personagem nunca tivesse existido.

Sobre a parcialidade de Flávio Josefo e o necessário enfoque crítico acerca de seus escritos, destaque-se o entendimento do historiador e professor de Estudos Judaicos da Wolfson College - Oxford, o Dr. Martin Goodman:
“A narrativa detalhada de Josefo, portanto, foi totalmente explorada neste livro. Mas os seus juízos de valor têm sido tratados como mais do que um pouco suspeito. Quando eles não podem ser comprovados a partir de sua narrativa detalhada, foram tidos como representantes da atitude não de todos os judeus da Judeia, mas apenas da classe dominante a que ele pertencia. Nem ele mesmo era típico de sua própria classe. Sua carreira na corte imperial romana pode tê-lo levado a um entusiasmo sobre a superioridade do poder romano que outros judeus ricos não podem ter compartilhado, e poucos outros judeus teriam simpatizado com a forma como, à maneira de outros historiadores contemporâneos tentando agradar seus patronos, ele descreveu os imperadores Vespasiano e Tito, que tinham sido seus benfeitores, com excruciante lisonja.
Para conseguir uma melhor perspectiva sobre a narrativa de Josefo, por isso, é necessário olhar para fora das suas obras, e para definir a revolta contra o pano de fundo religioso, literário, social, econômica e cultural dos judeus na Judeia na medida em que podem ser coletados a partir de outras fontes.”[28]
Obviamente, a história de um senador “desgraçado” na revolta judaica devia circular nos meios aristocráticos romanos do período. Afinal, muitos ali o conheceram. Mas quando esta geração se foi e os séculos passaram, o fato se perdeu e a História, muito naturalmente, ignorou-o por não ter o mínimo conhecimento de sua existência. Muitos leitores poderão se perguntar se isso seria possível? Recordemos Pompeia, soterrada pelo vulcão Vesúvio (no nosso entender, este foi o “11 de setembro” dos romanos), no ano 79 d.C. Certos de que os deuses decidiram destruí-los, demonstrando que a fortuna não estava mais ao lado deles, todos os registros sobre a ‘urbis’ foram apagados e somente mais de quinze séculos depois começaram a ser redescobertos por acaso pela população italiana que, atônita, encontrara sob seus pés uma cidade antiga preservada como que em uma capsula do tempo. 

Mesmo depois desta explanação, alguns poderão mencionar o trecho em que Josefo cita nominalmente os indivíduos que participaram do conselho de guerra de Tito, afirmando não existir nenhum Cornelius Lentulus entre eles. Esquecem-se, entretanto, de complementar a frase, que segue assim:
“após estes, vinham também à reunião os procuradores e tribunos”[29]
Quem foram estes homens? Quais os seus nomes? A que famílias pertenciam? De onde vieram? Fica a indagação, muito longe de qualquer resposta.

Muitos ainda afirmam que não existiu nenhum Publius Lentulus em Pompeia. Ora, mas quem disse que as escavações estão completas? Pelo menos, 1/3 da cidade continua aguardando, enterrada, os trabalhos arqueológicos. Villas e até mesmo restos mortais humanos jazem ocultos no subsolo da atual Campânia. Quem pode garantir que, no porvir, não tenhamos novidades neste sentido? 

Mais tolo ainda é afirmar que, entre a lista dos senadores da Roma Antiga, não existe tal figura. Ora, onde está a tal lista? Ela não existe! Em 1200 anos de História, milhares ocuparam esse cargo e não conhecemos senão uns poucos:
“Uma tentativa de estabelecer qualquer tipo de catálogo completo incorre no risco adicional de omissões. Para o Império Romano, o material é vasto e proibitivo: um editor dificilmente deixará de falhar quanto à falta de alguns nomes e fatos, seja qual for a sua sagacidade e produtividade. Embora a República seja à primeira vista mais gerenciável, a sua época de fechamento começa a antecipar o Império pela infinidade de nomes e heterogeneidade de fontes.( ... )Quem admitir ou excluir, não deve ter sido fácil para estabelecer a linha. Quanto aos senadores, atestado inequívoco de status foi claramente exigido. Caso contrário, pode não haver fim. Os textos literários revelam certas pessoas que dificilmente não foram senadores. Assim, o romano estóico Q. Lucilius Balbus, ou (irmão ou primo) L. Lucilius Balbus, o eminente advogado que recebeu instruções de Mucius Scaevola e passou para Ser. Sulpicius Rufus.Por um cânone rigoroso estaria correto afastar estes homens. Além deles, MRR será descoberto por ter deixado de fora um número de senadores indubitáveis. Alguns têm que ser rastreados em recessos obscuros da literatura, alguns removidos por fusão prematura com outras pessoas. Escritos familiares podem render uma colheita inesperada, e muitas vezes há lucro a ser adquirido a partir de um exame minucioso do contexto em que um homem é nomeado.( ... )Daí a lista de senadores aqui apresentada. Isso equivale a quarenta e cinco nomes, arrolados na ordem alfabética de um Aemilius Lepidus ao o parente de C. Verres. A minoria incide dentro do âmbito da MRR I, o resto pertence ao período de 99-31. Homens obscuros, na maior parte. Havia muitos desses, na geração após Sulla, quando o Senado contava com cerca de seiscentos membros. E necessariamente assim. Do total, não mais do que dois terços podem ser identificados em qualquer momento.( ... )Para maior comodidade a lista vai admitir um ou dois homens entre a margem de autenticação: caso contrário, eles podem ser totalmente perdidos para análise.( ... )Há uma outra margem, aquela do momento e do período. MRR engloba, com o devido aviso, sete senadores, conhecidos apenas por inscrições que não permitem uma data exata.( ... )Vários critérios, tais como a ausência de cognome ou o estilo ou a formulação do documento, sugerem uma datação aproximada - ou seja, do final da República para o início do império”[30]
Por fim, queremos esclarecer que, mesmo em vista de todas as facilidades de comunicação e informação do século XXI, foi extremamente difícil encontrar elementos concretos sobre este cônsul suffectus, bem como notícias sobre o que seria este cargo e o de legado honroso (legação livre ou Legatio libera). Livros antigos em latim, inglês, francês e alemão foram consultados; nenhum deles ainda traduzidos para o português. Imediatamente, voltamos no tempo para lembrarmos daquela Pedro Leopoldo, cidade pequenina de Minas Gerais, a fim de louvamos o alcance mediúnico de Chico Xavier, cujo lápis, célere, grafou em centenas de páginas a saga completa passada na Roma Antiga, cujos personagens e suas ocupações, cidades e monumentos aí citados, gradativamente, vão sendo redescobertos historicamente pela ação investigativa dos que trabalham, na seara espírita, a fim de que a luz da verdade se faça entre nós.[31]

Aguardemos o tempo!


Biblioliografia:

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- TRICCA, Maria Helena Apócrifos - Os proscritos da Bíblia.Vol.II. Ed. Mercuryo (1995);
- XAVIER, Francisco Cândido Há dois mil anos, Federação Espírita Brasileira 47º ed., RJ (2006);
- Dictionnaire de la Bible, F. Vigouroux et al., Letouzay & Ané Éditeurs, Paris, 1908. No tomo IV;
- Enciclopedia Universal Ilustrada Europeo-Americana, Ed. Espasa-Calpe, Madrid, s/d. No vol. XXIX;
- Diário da Noite. Nº 3544. Ano XVI. Edição de 09 de agosto de 1944.



[1] Explicação de Francisco Cândido Xavier. Do livro Emmanuel. Ed. FEB, 1997. p. 15

[2] TRICCA, Maria Helena Apócrifos - Os proscritos da Bíblia.Vol.II. Ed. Mercuryo. 1995.

[3] Tradução livre de: ‘Publius Lentulus: personnage imaginaire auquel on a attribué une lettre apocryphe décrivant la personne de Notre Seigneur. Il est a censé avoir été gouverneur de la Judée, avant Ponce Pilate, et avoir écrit la lettre qui suit au Sénat romaine. (…) La lettre de Lentulus est une composition apocryphe : la caractère apocryphe de cette lettre est indubitable. Les copistes savent trop quel titre donner à son auteur prétendu; ce titre varie dans la plupart des manuscrits qu’on en connait; les uns l’appelent proconsul, d’autres gouverneur ou « praeses Hierosolymitanorum », etc. Leur embarras provient de ce qu’il n’y a jamais eu à Jérusalem ni en Judée de gouverneur de nom Lentulus. Il existait un « praeses » ou un « proconsul Syriae », et un « procurator Iudaeae ». Bien plus, aucun procurateur de Judée ne c’est appelé Lentulus. (…) D’ailleurs, un Romain n’aurait jamais pu employer plusieurs des expressions qu’on lit dans la lettre : « propheta veritatis », « filii hominum » ; ce sont là des hébraïsmes, et le dernier est emprunté au Ps. XLIV, 3. La dénomination de « Jesus Christus » trahit aussi une époque postérieure et est empruntée au Nouveau Testament. Enfin, sans relever d’autres détails, notons que, si elle avait été écrite par un procurateur de Judée, elle aurait été adressée non au Sénat, mais à 1’empereur, parce que la Syrie, dont faisait partie la Judée, était une province impériale, et non une provinnce sénatoriale. (..) Aucun ancien écrivain ecclésiastique n’a parlé de la lettre de Lentulus, quoiqu’ils aient si souvent cité les autres écrites apocryphes connus de leur temps.’ (Dictionnaire de la Bible, F. Vigouroux et al., Letouzay & Ané Éditeurs, Paris, 1908. No tomo IV, cols. P.167-172).

[4] Tradução livre de: “Léntulo, Públio: Hist., personaje histórico ficticio, supuesto gobernador de Judea antes de Poncio Pilatos. Atribúyesele una carta dirigida al Senado y pueblo romanos, en la que se da cuenta de la existencia de Jesús y se dan pormenores de su aspecto exterior y de sus cualidades morales, terminando con la afirmación que Jesús era ‘el más hermoso de los hijos de los hombres’. El origen de esto documento es desconocido; lo cierto es que fue impreso por primera vez en la Vita Christi de Ludolfo Cartujano (Colonia, 1474), y por segundo vez en la Introducción a las obras de San Anselmo. Nuremberg, 1491. (Enciclopedia Universal Ilustrada Europeo-Americana, Ed. Espasa-Calpe, Madrid, s/d. No vol. XXIX, p. 1611-1612).

[5] Tradução livre de: “Publius Lentulus is a fictitious person, said to have been Governor of Judea before Pontius [Pilate], and to have written the following letter to the Roman Senate (…) The letter of Lentulus is certainly apocryphal: there never was a Governor of Jerusalem; no Procurator of Judea is known to have been called Lentulus; a Roman governor would not have addressed the Senate, but the emperor; a Roman writer would not have employed the expressions, ‘prophet of truth’, ‘sons of men’, ‘Jesus Christ’. The former two are Hebrew idioms, the third is taken from the New Testament. The letter, therefore, shows us a description of our Lord such as Christian piety conceived him.”(The Catholic Encyclopaedia . http://www.newadvent.org/cathen/09154a.htm. Acessado em 13/01/2014 às 00:40).

[6] Jornal Diário da Noite – trechos da reportagem de 9 de agosto de 1944. p. 08

[7] XAVIER, Francisco Cândido Há dois mil anos, Federação Espírita Brasileira 47º ed.

[8] MARRECAS, Manuel Martiniano Antiguidades romanas Imp. Nacional, LISBOA. 1872. p. 68. Adendo explicativo nosso.

[9] NIEUPOORT, Usos e costumes dos romanos. Ed. José Rodrigues. 1865. p. 123 e 124.

[10] Tradução livre de: “Between offices a successful nobilis took care of his economic interests and lived the social life of the landed gentry. Temporary retirement from the business of the res publica was certainly not unusual or a reason for criticism.” (JEHNE, Martin. The rise of the consular as a social type in the third and second centuries BC. In: BECK, Hans; DUPLÁ, Antonio; JEHNE, Martin; POLO, Francisco Pina. Consuls and Res Publica - Holdinh High Office in the Roman Republic. New York: Cambridge University Press, 2011, p. 212).

[11] Tradução livre de: “Hence Senators in foreign countries were treated with the highest respect, Cic. in Verr. iv. 11. And as Senators were not allowed to leave Italy without permission (sinne commeatu), Cic. Attic. viii. 15. Suet. Claud. 16. 23. Ner. 25. unless to Sicily and Galia Narbonesis, Dio. liii. 42. when they had occasion to travel abroad, they usually obtained the privilege of a free legation, as it was usually called (sine mandatis, sine ullo reipublicae munere; ut haeritates aut syngraphas suas persequerentur,) Cic. de Legg. iii. 8. Ep. Fam. xi. 1. Att. xv. 12. Suet. Tib. 31. which gave them a right to be treated every where with the honours of an ambassador. In the province they had lictors to attend them, Cic. Ep. Fam. xii. 21.” (ADAM, Alexander. Roman antiquities: or, An account of the manners and customs of the Romans. London: Cadell and Davies, 1819, p. 20).

[12] Tradução livre de: “Whenever they travelled abroad, even on their own busines, they were maintained at the public expence, and always found provisions for themselves and their attendants ready prepared on the road; a privilege that was generally termed free legation.” (LEMPRIERE, John. Bibliotheca Classica, Or, A Classical Dictionary: Containing a Full Account of All the Proper Names Mentioned in Antient Authors : with Tables of Coins, Weights, and Measures in Use Among the Greeks and Romans : to which is Now Prefixed a Chronological Table. London: A. Strahan, 1801, p. 749 - verbete Senatus).

[13] 47 ª edição. p. 43.

[14] Id. p. 77.

[15] Id. p. 41.

[16] Id. p. 126.

[17] Id. p. 239.

[18] ARIÈS, Philipe e DUBY, Geordes História da vida privada – Do Império Romano ao ano mil. Companhia De Bolso, SP. 2012. p. 95-96.

[19] Id. p.97.

[20] MARRECAS, Manuel Martiniano Antiguidades romanas Imp. Nacional, LISBOA. 1872. p. 43.

[21] NIEUPOORT Usos e costumes dos romanos. Ed. José Rodrigues. 1865. p. 18.

[22] Tradução livre de: “p. [cornelius] le[ntulus?] cos.suf.cum c sall[ustio] a. 27 fasti mag: sed non constat, num re vera Lentulus quidam ignotus indicatus fuerit.”

[23] 47ª edição. p.40.

[24] HENRIQUE, João. Roma pagã. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1935. p. 35.

[25] 47ª edição. p. 103 - Destaques nossos.

[26] Tradução livre de: “In fact, the religious duties performed by the consuls during the first few weeks in office were among their most important functions. Roman religion was national and civic, and its practice was a political issue since it concerned the entire civitas. Most religious activities were performed in public, according to stringent rules, and their main purpose was to maintain or to restore the pax deorum. There were experts grouped into various priestly collegia who served as essential, qualified advisers, but the management of religious affairs was in the hands of the senate and the maintenance of the direct relationship between the community and the gods was assigned to the magistrates, particularly to the consuls as supreme magistrates of the civitas.
(...)
The main religious duty of the consuls upon taking office was to deal with the expiation of all the prodigies that had occurred in Rome and in Italy during the previous months. To the Roman mentality, prodigia included all phenomena considered supernatural or unearthly. They were perceived as an earthly expression of the wrath of the gods. Thus, the prodigy generally meant that the pax deorum had been breached by some inadequate human action, or expressed a warning for the future. The misdemeanours committed or the mistakes made by citizens were not solely of a private nature. On the contrary, they had an impact on the community and imperilled its very existence. It was therefore necessary to re-establish the appropriate relationship between the civitas and the gods of Rome by means of suitable expiation ceremonies. Such a task could only be performed by the magistrates who were the representatives of the citizens and who could thus rightfully and legitimately act on their behalf.
Prodigies could be observed by any individual, whether a simple citizen, a priest or a magistrate. In principle, since it meant an alteration in the normal course of events, a prodigium represented a danger. But the mere observation of a phenomenon considered as supernatural was not enough for it to be automatically considered a prodigium. For that purpose it was essential for the senate to recognize it as such and for its expiation to involve the state. For this reason, all of the alleged prodigia that occurred during a given year were compiled so that one of the new consuls, either on the first day he took office or immediately thereafter, could bring a list of prodigies before the senate. The consul produced his report on behalf of the people, and it included all of the details collected on each of the phenomena. If he deemed it convenient, he could even complement the relatio with the introduction before the senate of eyewitnesses to the occurrence. Senators would then decide whether the events described could indeed be considered as omens sent by the gods, that is, as prodigia.
Once the deliberations were over, the senate issued the corresponding decree.Only then did the presumed divine signs officially become prodigia.
The senatus consultum also included the answer to be given to the gods by the civitas. If the prodigies were already known or even if they were frequent and considered to be not too important, senators would straight away order expiatory ceremonies. These were entrusted to the consuls, who could then decide on the specific form of the rituals to be celebrated in honour of the gods, as Livy sometimes emphasizes.13 However, if the prodigies were unknown, or if they were considered to be particularly serious, the senate would decide to consult the experts: pontiffs, augurs, persons in charge of the Sibylline Books or haruspices – the senate went either to only one of these priestly colleges or to two of them jointly. Upon receiving an answer, the senate met again to deal with the question and then commissioned the expiation ceremonies that had been recommended. As in the previous case, the consuls were in charge of the sacrifices.
In the procuratio prodigiorum there was, therefore, a clear division of roles: any citizen could report or give a warning; only the senate could decide if it was in fact a case of divine omens worthy of being taken into consideration and thus determine how to react; only the consuls could then provide the appropriate response required by the divinity in order to achieve the pacification of the relationship between gods and Romans.
(...)
(...) any potential prodigium meant a breach of the pax deorum.” (POLO, Francisco Pina. Consuls as curatores pacis deorum. In: BECK, Hans; DUPLÁ, Antonio; JEHNE, Martin; POLO, Francisco Pina. Consuls and Res Publica - Holdinh High Office in the Roman Republic. New York: Cambridge University Press, 2011, p. 97-100). 

[27] 47 ª edição. p. 132 e 133.

[28] “Josephus' detailed narrative has therefore been fully exploited in this book. But his value judgements have been treated as more than a little suspect. When they cannot be substantiated from his detailed narrative, they have been taken as representative of the attitude not of all Judaen Jews but only that of the ruling class to which he belonged. Nor he was entirely typical even of his own class. His career in the Roman imperial court may have led him to an enthusiasm about the superiority of Roman power which other wealthy Judeans may not have shared, and few other Jews will have sympathized with the way that, in the manner of other contemporary historians trying to please their patrons, he depicted the emperors Vespasian and Titus, who had been his benefactors, with excruciating flattery.
To achieve a better perspective on Josephus’ narrative it is therefore necessary to look outside his works and to set the revolt against the religious, literary, social, economic and cultural background of Jews in Judaea in so far as it can be culled from other sources.” (GOODMAN, Martin. The Ruling Class of Judaea. New York: Cambridge University Press, 1987, p. 21).

[29] JOSEFO, Flávio Guerra dos judeus livro VI. Juruá editora, CURITIBA. 2009. p. 52.

[30] Tradução livre de: “An attempt to establish any kind of complete catalogue incurs the added risk of omissions. For the Roman Empire, the material is vast and forbidding: an editor can hardly fail to miss some names and facts, even within restricted categories, whatever his sagacity and industry. Though the Republic is at first sight more manageable, its closing epoch begins to anticipate the Empire by the plethora of names and heterogeneity of sources.
(...)
Who to admit or exclude, it cannot have been easy to draw the line. As for senators, unequivocal attestation of status has clearly been demanded. Otherwise, there might be no end. The literary texts reveal certain persons who can hardly not been senators. Thus, the Roman Stoic Q. Lucilius Balbus, or (brother or cousin) L. Lucilius Balbus, that eminent lawyer who had instruction from Mucius Scaevola and passed it on to Ser. Sulpicius Rufus. 
“The study of persons carries with it many hazards, even when it operates by selection. An attempt to establish any kind of complete catalogue incurs the added risk of omissions. For the Roman Empire, the material is vast and forbidding: an editor can hardly fail to miss some names and facts, even within restricted categories, whatever his sagacity and industry. Though the Republic is at first sight more manageable, its closing epoch begins to anticipate the Empire by the plethora of names and heterogeneity of sources.
(...)
Who to admit or exclude, it cannot have been easy to draw the line. As for senators, unequivocal attestation of status has clearly been demanded. Otherwise, there might be no end. The literary texts reveal certain persons who can hardly not been senators. Thus, the Roman Stoic Q. Lucilius Balbus, or (brother or cousin) L. Lucilius Balbus, that eminent lawyer who had instruction from Mucius Scaevola and passed it on to Ser. Sulpicius Rufus. 
(...)
On a rigorous canon it was right to bar these men. Apart from them, MRR will be found to have left out a number of indubitable senators. Some have to be tracked down in obscure recesses of literature, some extricated from premature amalgamation with other persons. Familiar writings can yield an unexpected harvest, and there is often profit to be gleaned from close scrutiny of the context in which a man is named. 
(...)
Hence the list of senators here presented. It amounts to forty five names, ranging in order of the alphabet from an Aemilius Lepidus to the parent of C. Verres. A minority fall within the purview of MRR I; the rest belong to the period 99 - 31. Obscure men, for the most part. There were many such, in the generation after Sulla, when the Senate comprised about six hundred members. And necessarily so. Of the total, no more than two thirds can be identified at any time.
(...)
For convenience the list will admit one or two men hanging on the margin of authentication: otherwise they may be wholly lost to view.
(...)
There is another margin, that of time and period. MRR takes in, with due warning, seven senators, known only from inscriptions that do not permit an exact date.
(...)
Various criteria, such as the absence of cognomen or the style or the formulation of the document, suggest an approximate dating - that is, from late Republican to early imperial.” (SYME, Ronald. Historia: Zeitschrift fur Alte Geschichte. Vol. 4. Stuttgart: Franz Steiner Verlag, 1955, p. 52-71).

[31] Destaque-se que na época da psicografia de ‘Há dois mil anos’ não havia biblioteca pública em Pedro Leopoldo e Belo Horizonte.



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