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quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Apocalipse Segundo o Espiritismo: uma proposta de estudo

Queridos irmãos,

ofereço-lhes o material abaixo para o acompanhamento da série de estudos que serão desenvolvidos no Portal Saber Espiritismo em torno do Apocalipse de João, sempre à luz dos ensinamentos espíritas.

Ajudem-nos a divulgar o arquivo, bem como os vídeos que virão.

Página: https://www.saberespiritismo.com/

Fiquem com Deus!


Belo Horizonte, 30 de agosto de 2018.

Marco Paulo D. Di Spirito


I - O universo dos eleitos e o universo das gentios. A cidade santa e a grande cidade. As “Jerusaléns” e as “Babilônias”. O espiritualismo e o materialismo.

           Todos os seres da criação evoluem rumo à inalterável felicidade característica de espíritos puros (item 113 de O Livro dos Espíritos). O desenvolvimento individual é desígnio de Deus e não pode ser contornado. Em sua infinita sabedoria, o Criador deixa a cada um a liberdade de escolha, a resultar no mérito pessoal de acordo com as opções (item 123 de O Livro dos Espíritos). “Sem o livre-arbítrio, o homem seria máquina” (item 843 de O Livro dos Espíritos), motivo pelo qual Deus não dirige os passos de seus filhos por regime de violência. “A convicção não se impõe” (item 841 de O Livro dos Espíritos), de modo que o Criador oferece paulatinamente o acesso à verdade, segundo o degrau evolutivo da individualidade. Os esclarecimentos devidos surgem por intermédio dos seus mensageiros e ministros (item 113 de O Livro dos Espíritos). Tais ensinamentos sublimes, que podem ser comparados ao símbolo do “vinho puro”, são oferecidos aos grupos que já se apresentam mais aptos para absorvê-los. Essa é a razão do investimento espiritual sobre o povo judeu, de acordo com explicações de Emmanuel em passagem que será avaliada adiante. Graças à atuação obstinada deste povo, importantes ensinamentos espirituais, sob a batuta do Deus único e da consequente unidade das leis que presidem a realidade, foram transmitidos à posteridade, em cumprimento da previsão manifestada a Abraão (Gn 15:1-5).

A luz que se projeta sobre uma área permite, ao mesmo tempo, o destaque das trevas do entorno. Eis o contraponto básico entre o que foi iluminado e o que está para se iluminar. A coletividade eleita para atuar como depositária dos investimentos espirituais é a portadora da luz (= conhecimento), diferenciando-se dos povos que ignoram as realidades da vida espiritual. Não se interprete, aqui, qualquer proposta de maniqueísmo prático, uma vez que as “sementes espirituais” sempre foram disseminadas entre todas as culturas e épocas. Cuida-se apenas de uma alegoria para frisar a missão de um conjunto de espíritos que recebeu a importante incumbência de reunir um cabedal de ensinamentos superiores que preparou vinda de Jesus, “o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo” (item 625 de O Livro dos Espíritos).

Um dos principais objetivos desse contraponto, segundo a leitura que fazemos, é o de indicar a distinção entre o conhecimento efetivamente superior, provindo dos espíritos puros, face as tortuosas criações do convencionalismo humano. No momento adequado será demonstrado que tal forma de espelhamento convida à análise de antíteses e está diretamente relacionada à estrutura quiástica do texto do Apocalipse. Essa dualidade entre os eleitos e os pagãos, ou entre os judeus e os não-judeus (gentios) constitui piso fundamental para o desdobramento da narrativa do Apocalipse. Em verdade, são inúmeras as referências aos gentios desde o Velho Testamento, como se constata de passagens que objetivam, na essência, destacar o círculo daquilo que representa a cultura humana - “cultura secular que glorifica apenas a si mesma”[1] - com suas criações e valores transitórios. Âmbito esse que contrasta com o conjunto de ensinamentos ministrados diretamente pelos servos de Deus afetos à realidade das leis maiores que dirigem o cosmos. É a velha distinção entre o falso e o verdadeiro. Assim, as figuras chamam a atenção para o contraponto entre os ingentes esforços da verdade libertadora na dissolução da ignorância espiritual e para o confronto entre a lealdade dos que receberam o conhecimento espiritual, que não coadunam com os ídolos feitos por mão humana (Dn 14:5) e a conduta dos que perseguem valores deturpados (= vinho misturado – Dn 14:10).

Obviamente, a libertação pela verdade é oferecida para toda humanidade. “Não há distinção entre judeu e grego”, pois Deus é pai de todos (Rm 10:11), de modo que o chamado espiritual se dá também entre as demais nações (Rm 9:23, 24). O trabalho de renovação apenas se iniciava a partir de Jerusalém, conforme indicado no Evangelho de Lucas:

“Depois disse-lhes: ‘São estas as palavras que eu vos falei, quando ainda estava convosco: era preciso que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos'. Então abriu-lhes a mente para que entendessem as Escrituras, e disse-lhes: 'Assim está escrito que o Cristo devia sofrer e ressuscitar dos mortos ao terceiro dia, e que, em seu Nome, fosse proclamado o arrependimento para a remissão dos pecados a todas as nações, a começar por Jerusalém.’” (Lc 24: 44-47)

Jesus explica o objetivo de alcançar a todos os interessados:

“Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil: devo conduzi-las também; elas ouvirão minha voz; então haverá um só rebanho, um só pastor.” (Mt 10:16).

Pelo investimento espiritual naquela região, Deus estava a abrir caminhos de religiosidade aos gentios, para os quais os judeus deveriam transmitir os ensinamentos recebidos (1 Pe 2:9,10). Tenha-se, nesse sentido, a esclarecedora síntese de Kardec:

“Em muitas circunstâncias, prova Jesus que suas vistas não se circunscrevem ao povo judeu, mas que abrangem a Humanidade toda. Se, portanto, diz a seus apóstolos que não vão ter com os pagãos, não é que desdenhe da conversão deles, o que nada teria de caridoso; é que os judeus, que já acreditavam no Deus uno e esperavam o Messias, estavam preparados, pela lei de Moisés e pelos profetas, a lhes acolherem a palavra. Com os pagãos, onde até mesmo a base faltava, estava tudo por fazer e os apóstolos não se achavam ainda bastante esclarecidos para tão pesada tarefa. Foi por isso que lhes disse: Ide em busca das ovelhas transviadas de Israel, isto é, ide semear em terreno já arroteado, sabia que a conversão dos gentios se daria a seu tempo; mais tarde, com efeito, os apóstolos foram plantar a cruz no centro mesmo do Paganismo.” (O Evangelho Segundo O Espiritismo, Cap. XXIV, item 9).

 Anota Bruce Waltke que o livro de Gênesis apresenta Deus instituindo uma aliança com os patriarcas, transformando aquela nação num veículo de luz para os gentios, enquanto que em Êxodo–Deuteronômio é informada a aceitação, por parte de Israel, da aliança para espraiar às nações a luz recebida.[2] Essa missão permite uma adequada leitura sobre a simbólica transformação das doze tribos de Israel numa só nação[3], ponto ao qual se retornará oportunamente.

O Apocalipse está relacionado à efetivação das leis de Deus no planeta, o que corresponde à transformação da humanidade, representada pela simbólica Nova Jerusalém. Esse, contudo, é o resultado final de um longo caminho, que passa pela recepção dos ensinamentos espirituais superiores e sua difusão para os quatro cantos do orbe, as outras ovelhas (Jo 10:16), a abranger todas as nações.[4] Até os últimos eventos da regeneração estará presente, embora sob contínuo decréscimo, a polarização entre as duas realidades em tela: a luz e as trevas, o conhecimento e a ignorância, o âmbito da religiosidade e o âmbito dos artifícios humanos.

Nessas duas linhas, inicialmente separadas, mas que se encontram em momento futuro, podem ser enfeixados vários símbolos presentes nas escrituras e que são valiosos para a leitura do Apocalipse. Pelo âmbito da religiosidade alinham-se (i) os eleitos, (ii) o povo judeu, (iii) o povo dos santos, (iv) as “Jerusaléns” (em suas fases e desdobramentos simbólicos), (v) a cidade santa. Pelo ângulo dos valores eminentemente humanos encartam-se (i) os gentios, (ii) os estrangeiros, (iii) os adoradores de ídolos, (iv) as demais nações, (v) a grande cidade, (vi) as “Babilônias” (igualmente, em suas fases e desdobramentos simbólicos).

São âmbitos opostos que podem ser equiparados, sobretudo para a obtenção de conclusões de ética superior, à dualidade espiritualismo/materialismo, abordada por Allan Kardec com primor.





Na dinâmica do Apocalipse, como se verá oportunamente, esses dois universos, da religiosidade (= Jerusalém, cidade santa) e dos gentios (= Babilônia, grande cidade) se dilatam e, ao mesmo tempo, projetam-se um sobre o outro. Na linguagem do livro de Daniel, são “misturados por casamentos” (Dn 2:43). Existe, contudo, uma particularidade nessa trajetória. Em sintonia com as previsões bíblicas, as várias “Jerusaléns” falham em sua missão. Assim, no limiar do período designado por “grande tribulação”, a “Jerusalém da vez” já operava como a vinha ressequida que não produzia frutos, tal como discorre a parábola dos trabalhadores maus (Mt 21:33-45). A tarefa cometida a esta entidade foi avocada e transferida para outro povo, ironicamente para os “gentios”, que na linha da mesma parábola ficaram incumbidos de produzir os frutos almejados (Mt 21:41). Esses apontamentos poderão ser melhor compreendidos na medida dos desdobramentos que serão apresentados no presente estudo.

II - Os profetas, os lavradores maus e o destino das “Jerusaléns”

A leitura de textos atribuídos a alguns profetas, com destaque para Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel, permite a identificação de uma linha comum, relativa a reiterados apelos e advertências direcionados a Jerusalém.

Cuida-se de uma perspectiva simbólica (Ez 16:1), representativa de um povo destinatário de muitos ensinamentos espirituais (Is 51:16) e que pode ser projetada para toda a humanidade. Na essência, a Jerusalém verdadeira deve estar no coração (Jr 51:50), o que pede um olhar para além da história de uma etnia. Assim, a ilustração amolda-se a várias “Jerusaléns”, abarcando todas as fases desta específica população e também servindo para compreender os destinos de suas sucessoras, até a prometida e derradeira “Nova Jerusalém”.

Essa avaliação é relevante uma vez que o Apocalipse apresenta os mesmos símbolos e perfilha padrões semelhantes que serão comentados nas linhas que seguem. Ao final deste tópico serão apresentadas conclusões sobre a pertinência desse empreendimento.

Propõe-se, portanto, a apresentação da história simbólica das “Jerusaléns” a partir de três ângulos, do resumo à especificação.

Pela abordagem mais resumida, as advertências à “Jerusalém de todos os tempos” tratam do rompimento da aliança com Deus e das consequências advindas dessa separação.




Em aprofundamento intermediário, tenha-se que os textos dos profetas mencionam pontos que se repetem e que podem ser organizados na seguinte linha: (i) investimento espiritual sobre os homens, que recebem constantes ensinamentos pela via mediúnica; (ii) esse investimento espiritual chega como uma proposta de aliança dos homens com Deus; (iii) o comportamento desviado dos homens, apesar dos cuidados de Deus, no sentido da insubmissão, da rebeldia, da deslealdade, da traição e da fuga moral;  (iv) a fé desviada dos homens, assentada na idolatria e destacada pela confusão entre o sagrado e os valores humanos transitórios – o vinho misturado, conforme será comentado adiante; (v) o rompimento da aliança com Deus, por escolha dos homens; (vi) o advento de avisos e advertências sobre a necessidade de alinhar a conduta segundo a lei divina, a fim de evitar que desça sobre os homens um período de tribulações e angústias; (vii) a concretização do prenunciado tempo de tribulação, como retribuição à insistência no erro, com a simbólica atuação do fogo e da ira de Deus; (viii) a reunião do remanescente para a construção de um novo ciclo de evolução; (ix) o paralelismo desses eventos com a ilustração de uma vinha cultivada sob propósitos puros e posteriormente abandonada ou profanada, conforme indicado também na passagem dos lavradores maus (Mt 21:33-46, Mc 12-1-12, Lc 20:9-19).  Nessa linha, os textos proféticos em análise apontam o perecimento dos renitentes no erro e o arrendamento da vinha para outros agricultores, que terão êxito em entregar os frutos a seu tempo; (x) a formação de uma aliança nova com os homens, também representada pelo símbolo da Nova Jerusalém, tempo em que as leis divinas serão efetivamente consideradas e aplicadas.

Esmiuçando-se um pouco mais os relatos proféticos, com a citação de algumas passagens importantes, cabe iniciar pela compreensão do símbolo da Jerusalém (Ez 16:1).  A humanidade, como se sabe, experimenta ciclos. Para o tema deste estudo – o Apocalipse por João Evangelista – são relevantes dois ciclos simbólicos, o das “Babilônias” e o das “Jerusaléns”. Quanto a este último, não se tem em mira uma cidade e sim a representação dos homens que receberam os ensinamentos dos planos superiores para mudança de comportamentos, em busca da sublimação e da verdadeira felicidade. Na condição de ilustração, a Jerusalém está relacionada ao coração de cada individualidade (Jr 51:50). Em virtude de representar o povo que recebe o investimento superior (Is 51:16), a figura se projeta para toda a humanidade destinatária dos ensinamentos espirituais, notadamente no que toca às mensagens de Jesus. Sob a perspectiva cíclica, são várias as “Jerusaléns”.

Emmanuel explica os motivos do investimento pretérito sobre “a árvore de Davi”: cuidava-se de uma raça forte, homogênea, que depositava grande fé na existência de um Deus Único, Pai de todas as criaturas, por amor do qual se devia “sofrer todas as injúrias” e “tolerar todos os martírios”, ao passo que também era grande o seu orgulho, afigurando-se a coletividade mais necessitada, “dada a sua vaidade exclusivista e pretensiosa.”[5]

Do ponto de vista de agrupamentos que recebem a missão de difundir e concretizar os ensinamentos superiores, existe uma sucessão de “Jerusaléns” ou “cidades santas”. O ícone não se restringe à Jerusalém propriamente dita, em suas várias fases de ascensões e quedas, o que abarca a significativa destruição do templo por três vezes (586 a.C, 70 d.C, 135 d.C).[6]

Também diz respeito à transposição da árvore para “terreno estrangeiro” e da qual, posteriormente, sobrou apenas o toco que foi mantido na terra, com suas raízes e cadeias de ferro e de bronze (Dn 4:12, Dn 4:20), símbolos que poderão ser melhor compreendidos pelo conjunto dos estudos que seguirão. Nesse encadeamento, constata-se a teimosa permanência no erro (Jr 13:27) e as várias oportunidades que foram concedidas aos homens investidos na missão sublime (Jr 24:5-8). A queda no cumprimento desses deveres foi antevista pelos profetas, que também anunciaram períodos de tribulação em retribuição aos desvios, que transcorreriam sobre “as ruínas de Jerusalém” (Dn 9:1). Para as sucessivas “Jerusaléns”, cabe o apontamento de Ez 16:44: “Tal mãe, tal filha”. Emmanuel esclarece que a existência histórica de Jerusalém constitui uma “lição dolorosa para todos os povos do mundo”, em torno “das consequências nefastas do orgulho e do exclusivismo”.[7]

Para a análise desse desdobramento, a parábola dos lavradores maus auxilia como fio condutor. O seu teor, segundo o Evangelho de Mateus, é o seguinte:

“Escutai outra parábola. Havia um proprietário que plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe, abriu nela um lagar e construiu uma torre. Depois disso, arrendou-a a vinhateiros e partiu para o estrangeiro. Chegada a época de colheita, enviou os seus servos aos vinhateiros, para receberem os seus frutos. Os vinhateiros, porém, agarraram os servos, espancaram um, mataram outro e apedrejaram o terceiro. Enviou de novo outros servos, em maior número do que os primeiros, mas eles os trataram da mesma forma. Por fim, enviou-lhes o seu filho, imaginando: ‘Irão poupar o meu filho.’ Os vinhateiros, porém, vendo o filho, confabularam: ‘Este é o herdeiro: vamos! matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança.’ Agarrando-o, lançaram-no para fora da vinha e o mataram. Pois bem, quando vier o dono da vinha, que irá fazer com esses vinhateiros?' Responderam-lhe: ‘Certamente destruirá de maneira horrível esses infames e arrendará a vinha a outros vinhateiros, que entregarão os frutos no tempo devido.’ Disse-lhes então Jesus: ‘Nunca lestes nas Escrituras:
A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; pelo Senhor foi feito isso e é maravilha aos nossos olhos?
Por isso vos afirmo que o Reino de Deus vos será tirado e confiado a um povo que produza seus frutos. Aquele que cair sobre esta pedra ficará em pedaços, e aquele sobre quem ela cair, ficará esmagado.
Os chefes dos sacerdotes e os fariseus, ouvindo as suas parábolas, perceberam que se referia a eles. Procuravam prendê-lo, mas ficaram com medo das multidões, pois elas o consideravam um profeta.” (Mt 21:33-45)



Os profetas, servos de Deus, foram frequentemente enviados (Jr 7:25,26), a demonstrar um investimento sobre os homens que se assemelha ao da vinha que o “senhor” (rectius, o Senhor) arrendou a agricultores. Várias passagens das escrituras atribuídas aos profetas antigos amoldam-se significativamente aos destacados ensinamentos de Jesus sobre os lavradores maus (Mt 21:33-46, Mc 12-1-12, Lc 20:9-19). Nessa ótica cabe considerar que o vinho produzido representa o espírito renovador, a essência dos ensinamentos de Deus, o emblema do trabalho do Criador. Oportunamente, em comentários a Ap 14:18, será demonstrada a vinculação direta desse símbolo com o Espiritismo. Assim, quando os textos antigos mencionam que Deus plantou uma vinha excelente, toda de cepas legítimas (Jr 2:21), estão se referindo à pureza do ensinamento, na sua simplicidade transformadora. No início, era uma vinha fecunda e viçosa, com cepas vigorosas (Ez 19:10). Israel é comparada a essa vinha exuberante que dava frutos (Os 10:1). A concessão da vinha está vinculada à aliança que Deus propõe aos homens, aos quais caberiam fidelidade à lavoura que conduz à produtividade.

Os homens, por sua vez, retribuíram com ingratidão. Recusaram-se a ouvir ou reconhecer as orientações espirituais superiores (Is 1:3, Dn 9:11, Is 30:9, Os 4:6, Jr 7:26-28). Foram rebeldes (Jr 6:28, 8:5, Ez 5:5,6, Ez 20:13), inflexíveis (Ez 3:7), mantiveram o coração empedernido (Ez 2:4) e perverso (Jr 16:12). Optaram por desprezar a verdadeira sabedoria (Jr 9:22,23) e decidiam por seguir os desejos inferiores (Jr 9:12, 13, Is 30:10), de sorte que não caminharam segundo a lei de Deus (Jr 32:23, 6:17). As sucessivas “Jerusaléns”, nesse contexto, são como a filha rebelde (Jr 31:22), constituem casa de rebeldes (Ez 2:5,6). Endurecidos ao ponto da arrogância, o coração desses homens tornou-se igual ao dos animais (Dn 5:20). A partir de então, o oleiro passou a ser tratado como a argila (Is 29:16), ou seja, pretendeu-se domínio sobre obras divinas (Is 45:11), quando, na realidade, Deus é o oleiro e as criaturas encontram-se na situação da argila (Is 64:7). Tudo isso representa, sob o ângulo da vinha, o abandono das terras arrendadas. Os lagares deixaram de ser pisados (Jr 48:31) e a produção da vinha tornou-se pífia (Is 5:10, 59:6).

O exemplo da vinha, do ponto de vista dos desvios humanos, também resulta em conclusões a respeito da qualidade do vinho que produz. Assim, passagens mencionam as uvas azedas (Is 5:4) e a vinha transformada em ramos degenerados (Is 2:21). Nesse ponto, cabe destacar a figura do vinho misturado, inicialmente aquele adicionado de água que, posteriormente, redundará no vinho misturado com fel. O suco da uva, tal como se encontra na origem, é uma bênção e não devia ser prejudicado (Is 65:8). Os “agricultores”, contudo, promoveram a sua mistura com a água (Is 1:22, Dn 14:10, Pr 23:30), o que representa a confusão da essência espiritual pura e simples com as tortuosas criações humanas, a ralear o conteúdo substancial. O vinho, portanto, se transformou em água envenenada (Jr 9:15, 23:15).


Esse sentido de vinho misturado suscita um outro paralelo, que diz respeito à confusão dos conhecimentos espirituais com os valores de outros agrupamentos, os “estrangeiros”, segundo os textos proféticos (e.g., Dn 11:39). Os depositários dos tesouros espirituais, integrantes da “cidade santa”, passaram a agir como os povos de outras terras, de modo a servir aos ídolos representados pelos símbolos do cobre, do estanho, do ferro, do chumbo, da madeira e da pedra (Ez 20:32, 22:17, Is 2:7, Br 6:2,3). Na dicção das escrituras, os costumes dos povos correspondem a vaidades (Jr 10:8), são ilustrados pela madeira cortada da floresta e trabalhada pelas mãos de um artista, ou seja, são obras humanas (Jr 10:3, Is 2:8, 17:7), que não representam o Deus vivo (Dn 14:24). E são produtos das mãos daqueles vestidos de púrpura violeta e escarlate (Jr 10:9), cores que possuem destacada significação no Apocalipse, como se verá. O que foi fundido (Os 13:2) ou composto com esses elementos corresponde à mentira, eis que desprovido do sopro divino, ridícula vaidade fadada a desaparecer no momento oportuno (Jr 10:13-15). Nenhuma ação divina se encontra nesses constructos (Br 6:50, 51, Is 30:1). Em suma, o vinho misturado equipara-se aos ídolos, criações mentirosas, obra de vaidade ou de zombaria (Jr 51:17,18). Os “agricultores”, agindo dessa maneira, optaram por seguir orientações humanas (Ez 20:18) e paulatinamente abandonaram o discernimento entre o sagrado e o profano, o puro e o impuro (Ez 22:26, Is 59:10). Perdeu-se o foco essencial (e.g., Is 1:11, 29:13, 1:14, Ez 20:26).

O vinho misturado, por sua vez, está diretamente vinculado ao desvirtuamento da fé (Is 30:12), por onde se infiltra a busca pelos interesses pessoais no âmbito do sagrado (Is 1:23). Aqui se destaca o símbolo da prostituição, por vezes associado à referida idolatria ou às distorções e abominações (Ez 20:30). Indicando o ato de compactuar com diretrizes que não provêm de Deus (Ez 20:30, Os 4:10, Dn 1:8), o sentido de prostituição, nas escrituras proféticas em análise, também está associado à bebedeira (Os 4:18, Is 22:13), que se faz justamente à custa do “vinho puro” (Is 56:12). A embriaguez atingiu a todos os habitantes da terra, designadamente os reis, os sacerdotes e os profetas (Is 13:13, Jr 23:9, 23:11). Confundidos pela bebida (Is 28: 7), sacerdotes e profetas já não relatavam visões de Deus, mas do seu coração (Jr 23:16). O desvirtuamento da fé gerou imundície (Is 28:8). Sob o influxo do vinho, os homens manejaram mal as taças (Dn 5:2). As taças sagradas foram utilizadas para servir aos ídolos de ouro, de prata, de bronze, de ferro, de madeira e de pedra (Dn 5:4). Compreende-se, pois, no que consiste a prostituição simbólica de Jerusalém, outrora a cidade fiel (Is 1:21).


A iniquidade se instalou no coração dos “agricultores da vinha”, que são os membros da Jerusalém prostituída. Abriu-se um abismo entre Deus e os homens (Is 59:1), que construíram para si sendas tortuosas (Is 59:8). Os humanos desenvolveram a sabedoria para o mal e a inabilidade para o bem (Jr 4:44). Lembre-se que não apenas os profetas foram perseguidos, como indica a passagem dos lavradores infiéis (Mt 21:34-39, Mc 12:2-7, Lc 20:10-15), mas o próprio Cristo (Is 53:7).

De acordo com as escrituras, para quem promove a mistura do vinho, reserva-se a espada (Is 65:11,12). Ai da coroa orgulhosa dos bêbados, que serão prostrados pelo vinho (Is 28:1)! Os homens, assim, foram frequentemente advertidos sobre dificuldades que poderiam advir caso optassem por se afastar de Deus.

São advertências que, no conjunto, amoldam-se à noção de “grande tribulação”, a ser abordada em separado. Trata-se de uma fase de dificuldades, de aperto (Is 8:23, 26:20), de devastação (Jl 1:15), um período de angústia (Ez 7:25) e crise (Ez 7:19). É o tempo do fim (Dn 8:17), igualmente denominado de fim dos dias (Ez 38:16), aquele “dia” específico, frequentemente anunciado (Ez 39:8), em que a iniquidade aumentaria (Dn 12:4, Ez 7:19) e quando se praticaria o crime final (Ez 35:5). É também o “dia do Senhor”, marcado por ausência de luz (Am 5:20), quando a cólera atingiria o cúmulo (Dn 11:36) e a “ira de Deus” transbordaria (Ez 38:18). Esse período perduraria até o “término da ira” (Dn 8:19) e objetivaria a purificação da terra (Ez 39:12, Dn 8:14).

Todas as “Jerusaléns” que falharam experimentaram a sua tribulação, todavia uma está relacionada ao estremecimento mais intenso da terra (Is 13:13), ao período de aflição que estabeleceria os povos em tumulto (Is 17:12). Vários profetas (= servos) foram encaminhados aos trabalhos da vinha, até que Deus enviou um auxiliar diferenciado, que é o próprio Jesus, referido como “o filho” (vide Mt 21:34-39, Mc 12:2-7, Lc 20:10-14). O período de tribulação mais preocupante só poderia se seguir ao sacrifício deste último. Trata-se, especificamente, do tempo de domínio do desolador (Dn 9:27), agente esse que recebeu vários nomes, dentre os quais podem ser citados: opressor (Is 1:17), escarnecedor (Is 29:20), devastador (Jr 12:12, 48:32), abominação (Ez 5:9), dominador de nações (Ez 31:11) e abominação da desolação (Dn 9:27). Segundo a leitura que fazemos, cuida-se da mesma figura que ao longo desse estudo será referida como “besta apocalíptica”. O último tempo de tribulação, visualizado no passado para dias longínquos (Dn 8:26, 11:35), corresponderia, assim, ao período de extensos dias, no qual os justos seriam perseguidos pela ação da besta apocalíptica, quando sofreriam a ação da espada, do fogo; experimentariam o cativeiro e a pilhagem (Dn 11:33).

Conforme consta em Am 3:7, Deus não faz coisa alguma sem antes revelar seu segredo aos seus servos, os profetas. Assim, foram frequentes (Is 46:10) as advertências a respeito da grande tribulação que a humanidade poderia sofrer caso não emendasse seu comportamento. A antevisão dessas dificuldades e dores (Jr 4:19, 20) é anunciada segundo o símbolo da trombeta (Ez 33:2,3, Is 27:13, Jr 4:5,6), cujo sinal deve ser atendido (Jr 6:17). A trombeta também anuncia o definitivo “dia do Senhor” (Jl 2:1). Existindo a reparação da conduta, tem-se, por conseguinte, o perdão divino (Jr 36:3), pois Deus é bondoso e misericordioso, lento para a ira e pleno de amor (Jl 2:12, Jn 4:2). Ele não quer a morte do ímpio, mas a sua conversão (Ez 33:11, 18:21). E muito pouco é pedido de cada ser humano para a mudança do caminho (Jr 2:36).


Por outro lado, também é dito nos textos antigos que Deus retribui (Is 34:8, 63:3) segundo o comportamento (Ez 7:9), faz cair sobre a cabeça dos homens os frutos de suas ações (Ez 9:10). De sorte que, para a expiação das iniquidades não reparadas (Is 40:2, 27:5), a simbólica vinha (Mt 21:34-39, Mc 12:2-7, Lc 20:10-14) é pisoteada e destruída (Is 5:5, 25: 10), desarraigada do solo com furor (Ez 19:12). Agentes desta destruição são os próprios pastores, que a transformam em deserto desolado (Jr 12:10,11, Os 2:5). A aridez é tamanha que por tais terras não passa o Filho do Homem (Jr 51:43). A videira perece (Is 24:7), sua colheita é inexistente ou insatisfatória (Is 32:10). Na parábola dos lavradores maus constata-se que a vinha é transferida para outros povos (Mt 21:40-44, Dn 4:25).

O vinho novo se perde (Is 24:7, 65:8). As complicações estabelecidas em torno dos ensinamentos superiores equiparam-se à ação de cavar cisternas fundas, onde não mais se poderia encontrar a água da vida (Jr 2:13). A contaminação do vinho novo e puro está relacionada à violação da aliança com Deus, estabelecida na “juventude” (Ez 16:59, Jr 2:2).

São símbolos que se entrelaçam e nessa tessitura é necessário compreender outra ilustração, que equipara a comunidade destinatária do investimento espiritual à noiva jovem, que se preparava para o casamento com o noivo, numa união alegórica entre a humanidade e Jesus. Em paralelo com a parábola dos lavradores maus, o desprezo e o sacrifício para com o “filho” (= Jesus) (Mt 21:37-39, Mc 12:6-8, Lc 20:13-15) situam no lugar da noiva a figura da prostituta, tão importante para o Apocalipse, aquela que se embriaga com o vinho desviado. A noiva se vende para os interesses inferiores, não se transforma na esposa. O casamento fica adiado para tempo indefinido. Essa união verdadeira virá com a última “Jerusalém”, cujos contornos serão apresentados linhas abaixo.


Segundo as escrituras, antes que o Evangelho frutificasse sobreviria o período da grande tribulação (Is 7:16), igualmente relacionado ao julgamento sobre os povos (Is 51:5). A leitura que fizemos nesse trabalho situa a grande tribulação no período que se segue à visita de Jesus no plano da carne, que corresponderia à parte intermediária do Apocalipse. Do abandono da aliança com Deus e da mistura do vinho puro com os valores transitórios decorre a retribuição divina (Jr 22:8). Em razão da prostituição (Ez 16:15) com os amantes (Ez 16:37), previu-se o período de trevas que cobriria as nações (Is 60:2, Jr 10:13,14).

Para esse interregno de expiações é relevante o contraponto entre taças com dois tipos de conteúdo. Num primeiro momento, tem-se a taça utilizada pelos traidores da aliança para sorver o vinho puro dos ensinamentos apenas com o escopo de extrair-lhes o prazer e a vertigem (Is 51:22). Refere-se à taça que embriagou a terra inteira, trazendo loucura às nações (Jr 51:7). Os responsáveis pelo desvio serão compelidos a beber da mesma taça, funda e larga (Ez 23:32) tendo agora o fel por conteúdo. A ilustração indica a consequência dos erros cometidos, na linha da simbólica ira de Deus (Jr 25:15, 49:12, Is 51:17). A essência profunda por trás de tais ícones merece reflexão à luz do vinho misturado com fel que deram de beber a Jesus (Mt 27:34).



A prostituta apocalíptica atuará por tempo limitado, durante o período da grande tribulação, e cairá no esquecimento (Is 23:15, 16). O “vaso”, produto de mãos humanas que não pode ser consertado será quebrado (Jr 19:10). Mas Deus atua como o oleiro que não desiste e construirá outro (Jr 18:1,6) a partir dos fragmentos que sobraram (Is 58:12, 4:3, Mq 4:7). Assim é que as escrituras preveem uma aliança definitiva com Jesus (Os 2:21, Jr 31:31), que interpretamos como aquela firmada com a Nova Jerusalém, também denominada no Apocalipse de esposa do Cordeiro (e.g., Ap 21:9). Para os que efetivamente atuaram na vindima (Is 62:9), haverá uma aliança (Jr 31:31), pela qual prevalecerá um espírito novo, com a renovação dos corações (Ez 11:19, 36:26-27). Os ídolos da pretensão humana desaparecerão (Is 2:18, 19) e serão removidas todas as abominações da cultura fantasiosa (Ez 11:18). Os povos afluirão para a verdadeira Jerusalém (Mq 4:1, Is 60:11, 66:20, Ez 37:20-28) e nela alcançarão outro estágio evolutivo (Ez 39:27, 28, Is 61:11), como uma renovação da plantação (Is 60:21). De sorte que a terra, que se encontrava em estado de desolação, tornar-se-á como o jardim de Éden (Ez 36:35). É a nova e última Jerusalém, aquela coletividade referida na passagem dos lavradores maus a quem Deus confiaria a vinha desprezada por outros, e que finalmente fará produzir os frutos esperados e, por conseguinte, o “vinho puro”. Cabem precisamente, aqui, as seguintes considerações de Kardec em torno da expressão “os tempos são chegados”:

“Quando, por conseguinte, a Humanidade está madura para subir um degrau, pode dizer-se que são chegados os tempos marcados por Deus, como se pode dizer também que, em tal estação, eles chegam para a maturação dos frutos e sua colheita.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 2)
  



A “Jerusalém redimida” será conhecida como “cidade da justiça”, “cidade fiel” (Is 1:26), “Deus está ali” (Ez 48:35), “casa de oração para todos os povos” (Is 56:7). Nela não haverá mais guerras (Is 2:4, 26:1-4, 32:18, Mq 4:3). Será o momento de um novo céu e uma nova terra, que representam novos ares, renovado paradigma (Is 65:17). Os redimidos serão o verdadeiro e definitivo “povo santo” (Is 62:12), concretizarão a humanidade evolvida (= Filho do Homem), a estável Nova Jerusalém (Dn 7:13,14). Nas fases finais do período de tribulação (= fim dos dias ou dos tempos), todas essas previsões podem ser compreendidas de forma mais clara (Jr 23:20).

Assim, pela lente condutora da parábola dos lavradores maus faz-se possível compreender as várias “Jerusaléns” e suas fases. Essa avaliação auxilia na leitura do Apocalipse, uma vez que seu texto se encontra centrado no período de domínio da “última Jerusalém desviada”, diretamente vinculada à besta apocalíptica, como se verá, bem como na sua transição para a Nova Jerusalém, aquela que realmente concretizará a união com Deus.

III - O período da grande tribulação, a fase de provas e expiações e o Apocalipse

Na Segunda Epístola a Timóteo, anota o apóstolo Paulo:

“Sabe, porém, o seguinte: nos últimos dias sobrevirão momentos difíceis. Os homens serão egoístas, gananciosos, jactanciosos, soberbos, blasfemos, rebeldes com os pais, ingratos, iníquos, sem afeto, implacáveis, mentirosos, incontinentes, cruéis, inimigos do bem, traidores, atrevidos, enfatuados, mais amigos dos prazeres do que de Deus; guardarão as aparências da piedade, negando-lhe, entretanto, o poder.” (IITm 3:1-5)

As vicissitudes referidas na passagem são geralmente associadas ao período denominado de “grande tribulação”. Extraída das escrituras bíblicas, essa noção relaciona-se a previsões mediúnicas sobre um período futuro, obviamente tendo-se em conta as datas em que foram recebidas, caracterizado por sofrimentos sem precedentes, que abrangeriam todo o planeta.[8] A palavra tribulação, como se sabe, traz o sentido de aflições ou adversidades. É o que se constata também de alguns trechos da autoria espiritual de Emmanuel:

“Há problemas que solicitam toda uma existência de renúncia constante, para que o fio do destino se alimpe e desembarace.
À vista disso, não desertes da prova que te segrega, temporariamente, na grande tribulação.”[9]

“Transposição, atrito, provas e desafios são condições de melhoria e aperfeiçoamento, ajuste e elevação. À vista disso, aceitemos em paz as tribulações que a existência nos imponha.”[10]

Nos textos bíblicos e especificamente na tradução que recebeu o título de Bíblia de Jerusalém, a palavra tribulação é repetida aproximadamente cinquenta vezes e geralmente se refere a eventos consequentes ao desprezo às leis divinas, resultantes da insistência humana no erro, mesmo após reiteradas advertências manifestadas pelos servos de Deus. Alguns trechos relevantes devem ser transcritos para análise:

“Que se envergonhem os meus perseguidores, mas que eu não me envergonhe! Que eles sejam amedrontados, mas que eu não seja amedrontado! Faze vir sobre eles o dia da tribulação; com uma dupla destruição, destrói-os!” (Jr 17:18)

“Ai! Porque este é o grande dia! Não há outro semelhante a ele! É um tempo de angústia para Jacó, mas ele será salvo! (Neste dia — oráculo de Iahweh dos Exércitos — eu quebrarei a canga que pesa sobre o teu pescoço e romperei as tuas cadeias. Então os estrangeiros não mais te dominarão, mas Israel e Judá servirão a Iahweh, seu Deus, e a Davi, o rei que suscitarei para eles.)” (Jr 30:7-9)

“E disse-me: 'Vou dar-te a conhecer o que acontecerá no término da ira, porque isto diz respeito à época fixada para o Fim.’” (Dn 8:19)

“Nesse tempo levantar-se-á Miguel, o grande Príncipe, que se conserva junto dos filhos do teu povo. Será um tempo de tal angústia qual jamais terá havido até aquele tempo, desde que as nações existem. Mas nesse tempo o teu povo escapará, isto é, todos os que se encontrarem inscritos no Livro.
E muitos dos que dormem no solo poeirento acordarão, uns para a vida eterna e outros para o opróbrio, para o horror eterno. Os que são esclarecidos resplandecerão, como o resplendor do firmamento; e os que ensinam a muitos a justiça hão de ser como as estrelas, por toda a eternidade. Quanto a ti, Daniel, guarda em segredo estas palavras e mantém lacrado o livro até o tempo do Fim. Muitos andarão errantes, e a iniquidade aumentará.” (Dn 12:1-4)

“Está próximo o grande dia de Iahweh! Ele está próximo, iminente! O clamor do dia de Iahweh é amargo, nele até mesmo o herói grita. Um dia de ira, aquele dia! Dia de angústia e de tribulação, dia de devastação e de destruição, dia de trevas e de escuridão, dia de nuvens e de negrume, dia da trombeta e do grito de guerra contra as cidades fortificadas e contra as ameias elevadas.” (Sf 1:14-16)

“Nesse tempo, vos entregarão à tribulação e vos matarão, e sereis odiados de todos os povos por causa do meu nome. Haveis de ouvir sobre guerras e rumores de guerras. Cuidado para não vos alarmardes. É preciso que aconteçam, mas ainda não é o fim. Pois se levantará nação contra nação e reino contra reino. E haverá fome e terremotos em todos os lugares. Tudo isso será o princípio das dores.” (Mt 24:9)

“Pois naquele tempo haverá uma grande tribulação, tal como não houve desde o princípio do mundo até agora, nem tornará a haver jamais.”(Mt 24:21)

“Logo após a tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão do céu e os poderes dos céus serão abalados. Então aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem e todas as tribos da terra baterão no peito e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e grande glória. Ele enviará os seus anjos que, ao som da grande trombeta, reunirão os seus eleitos dos quatro ventos, de uma extremidade até a outra extremidade do céu.” (Mt 24:29-31)

“Pois naqueles dias haverá uma tribulação tal, como não houve desde o principio do mundo que Deus criou até agora, e não haverá jamais.” (Mc 13:19)

“Naqueles dias, porém, depois daquela tribulação, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas estarão caindo do céu, e os poderes que estão nos céus serão abalados. E verão o Filho do Homem vindo entre nuvens com grande poder e glória. Então Ele enviará os anjos e reunirá seus eleitos, dos quatro ventos, da extremidade da terra à extremidade do céu.” (Mc 13:24-27)

“Quando virdes Jerusalém cercada de exércitos, sabei que está próxima a sua devastação. Então, os que estiverem na Judéia fujam para os montes, os que estiverem dentro da cidade saiam e os que estiverem nos campos não entrem nela, porque serão dias de punição, nos quais deverá cumprir-se tudo o que foi escrito. Ai daquelas que estiverem grávidas e estiverem amamentando naqueles dias!
Com efeito, haverá uma grande angústia na terra e cólera contra este povo. E cairão ao fio da espada, levados cativos para todas as nações, e Jerusalém será pisada por nações até que se cumpram os tempos das nações.” (Lc 21:22-24)

“O sol se mudará em escuridão e a lua em sangue, antes que venha o Dia do Senhor, o grande Dia. E então, todo o que invocar o nome do Senhor, será salvo.” (At 2:20,21)

“Tribulação e angústia para toda pessoa que pratica o mal, para o judeu em primeiro lugar, mas também para o grego; glória, honra e paz para todo aquele que pratica o bem, para o judeu em primeiro lugar e também para o grego. Porque Deus não faz acepção de pessoas.” (Rm 2:9-11)

“Justo é que Deus pague com tribulação aos que vos oprimem, e que a vós, os oprimidos, vos dê o repouso juntamente conosco, para quando se revelar o Senhor Jesus, vindo do céu, com os anjos do seu poder, no meio de uma chama ardente, para vingar-se daqueles que não conhecem a Deus, e que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus.” (II Ts 1:6-8)

Eu lhe respondi: ‘Meu Senhor, és tu quem o sabe!’ Ele, então, me explicou: ‘Estes são os que vêm da grande tribulação: lavaram suas vestes e alvejaram-nas no sangue do Cordeiro.’” (Ap 7:14)

É fato que os textos antigos mencionam tribulações parciais, relativas às fases já concretizadas das “várias Jerusaléns” (e.g., Dn 9:25), conforme leitura apresentada no tópico anterior. O objeto da presente cogitação está no principal período bíblico de aflições, igualmente chamado de “o grande dia” (Jr 30:7, Sf 1:14, At 2:20,21, Jd 1:6, Ap 6:17). De acordo com a interpretação que se propõe neste estudo, a grande tribulação está relacionada ao período de domínio da besta apocalíptica e consiste num dos temas centrais do Apocalipse de João.

Explica Dale Allison que para a literatura judaica a concepção de grande tribulação não é precisa e, portanto, suscita muitos questionamentos.[11] Evans Craig conclui que a leitura predominante compreende o período da grande tribulação entre o tempo presente até a próxima era, “os tempos que virão”, a “vinda do Reino de Deus”.[12]

A questão radica em identificar o início e o fim desse período, assim como o seu conteúdo. Cabe avaliar as propostas de compreensão do termo final.

Podem ser sintetizados em quatro as principais interpretações sobre o término da grande tribulação, que se verificaria quando: (i) do retorno de Jesus ao plano da carne para julgar as nações[13], o chamado juízo final[14]; (ii) do efetivo estabelecimento do povo de Deus na terra[15]; (iii) da concretização da redenção sobre o planeta[16]; (iv) da conflagração pelo armagedom, visão predominante entre os protestantes conservadores.[17] De acordo com alguns autores, esses eventos poderão ocorrer concomitantemente. Craig Keener também vincula o término dessa fase a um novo êxodo salvífico previsto para tempo futuro.[18] Há estudiosos que projetam a grande tribulação apenas para o momento imediatamente posterior ao esperado “retorno de Jesus”.[19]

Como se percebe, tudo o que Jesus representa é fundamental para o período em foco. Assim, se o início deste interregno suscita várias interpretações entre os que se debruçam sobre a Bíblia, por outro lado parece plausível sustentar que ele teria curso a partir de algum momento posterior à desvinculação do Mestre da matéria densa.

Compreendidos esses marcos, cabe avaliar os variados conteúdos que são geralmente associados à fase da grande tribulação.  Craig Keener vincula ao período o grande sofrimento que o “povo de Deus” experimentaria antes do “final dos tempos”.[20] Nos “últimos dias”[21] ocorreriam guerras gigantescas, pestes e cataclismos.[22]

A palavra cataclismo indica perturbações provenientes da natureza, a abranger as de ordem geológica. Allan Kardec, no livro A Gênese, os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo, refere-se aos cataclismos gerais, grandes comoções telúricas que marcaram as primeiras fases geológicas de formação do planeta, quando a “crosta sólida, por sua pouca espessura, só ofereceu uma tênue resistência à efervescência das matérias incandescentes do interior” (A Gênese, Cap. VII, item 11; Cap. IX, item 11). Uma vez que “essas comoções foram diminuindo de intensidade e de frequência à medida que a crosta se torna consolidada” (A Gênese, Cap. IX, item 11), o planeta adquiriu uma relativa estabilidade geológica e, assim, Kardec concluiu que o gênero humano encontrava-se a salvo de perturbações gerais desse tipo (A Gênese, Cap. IX, item 11). Por isso, manifestou-se o grande compilador das manifestações espirituais no sentido de que “passou o tempo dos cataclismos gerais, como os que marcaram os grandes períodos geológicos” (A Gênese, Cap. IX, item 11), aqueles que teriam a potencialidade de aniquilar a vida na Terra (A Gênese, Cap. VII, item 28) ou de alterar significativamente a conformação biológica no planeta (A Gênese, Cap. VII, itens 41, 42, 49, Cap. IX, item 5). Anota o mesmo mestre:

“Fisicamente, a Terra teve as convulsões de sua infância; entrou, então, em um período de estabilidade relativa, no progresso pacífico que se realiza mediante a repetição regular dos mesmos fenômenos físicos e pela participação inteligente do homem. Porém, está ainda em pleno trabalho de gestação do progresso moral. Ele será a causa de suas maiores comoções. Até que a humanidade tenha crescido suficientemente em perfeição, tanto pela inteligência como pela prática das leis divinas, as maiores perturbações serão causadas mais pelos homens que pela natureza, isto é, serão mais morais e sociais do que físicas.” (A Gênese, Cap. IX, item 14)

O raciocínio de Kardec, no particular, é de fácil compreensão. Encontrando-se o mundo físico regido por agentes naturais e inexistindo a ação do sobrenatural, uma vez consolidada a estrutura geológica do globo não seria racional conceber a sua destruição por causas fantásticas. Na síntese do próprio autor: “A maneira pela qual se opera a transformação é muito simples e, como se vê, ela é toda moral e se mantém entre as leis da natureza.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 28). Em razão disso, Kardec concluiu que os graves eventos previstos pela mediunidade de presciência não podem estar relacionados à referida concepção de cataclismos gerais:

“É, pois, da luta das ideias que surgirão os graves acontecimentos preditos e não de cataclismos ou catástrofes puramente materiais. Os cataclismos gerais foram consequência do estado de formação da terra. Hoje, não são mais as entranhas do planeta que se agitam: são as da humanidade.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 7)

Pode-se dizer, assim, que para o chamado “fim dos tempos” não haverá uma destruição dos fundamentos da natureza. Conforme resumido preambularmente na obra A Gênese, “Deus prova a sua grandeza e poder pela imutabilidade das suas leis e não pela sua suspensão.”

Isso não significa, por outro lado, que os trabalhos de Kardec assegurem aos passos da humanidade um caminho de amenidades. Basta considerar, nessa matéria, o que ele anota sob o título de “flagelos destruidores”.

Na seguinte passagem da obra A Gênese pode-se compreender a distinção entre flagelos causados pela ação humana (= morais) e os provenientes de causas naturais:

“Há várias classes de mal. Em primeiro lugar há o mal físico e o mal moral. Também podemos classificar os males entre aqueles que o homem pode evitar e os que são independentes de sua vontade. Entre esses últimos, é preciso incluir os flagelos naturais.” (A Gênese, Cap. III, item 4)

Em O Livro dos Espíritos são apresentados exemplos de flagelos naturais:

“Na primeira linha dos flagelos destruidores, naturais e independentes do homem, devem ser colocados a peste, a fome, as inundações, as intempéries fatais às produções da terra.” (O Livro dos Espíritos, item 741)

Calamidades como as guerras são enquadradas por Kardec nos eventos causados pela ação humana:

“Mas os males mais numerosos são aqueles que o homem cria pelos próprios vícios; proveniente de seu orgulho, de seu egoísmo, de sua ambição, de sua ganância, de seus excessos em todas as coisas. Essa é a causa das guerras e calamidades que causam desavenças, injustiças, a opressão do fraco pelo forte e, finalmente, a maioria das doenças.” (A Gênese, Cap. III, item 6)

Em mensagem assinada pelo espírito de Demeure, as guerras foram identificadas entre os flagelos destruidores:

“Os flagelos são os instrumentos de que se serve o grande cirurgião do Universo para extirpar, do mundo, destinado a marchar para frente, os elementos gangrenados que nele provocam desordens incompatíveis como o seu novo estado. Cada órgão, ou melhor dizendo, cada região será, sucessivamente, dissecada por flagelos de diversas naturezas. Aqui, a epidemia sob todas as suas formas; ali, a guerra, a fome. Cada um deve, pois, preparar-se para suportar a prova nas melhores condições possíveis, melhorando-se e se instruindo, a fim de não ser surpreendido de improviso.”[23]

Kardec, com suporte nos ensinamentos dos espíritos, explicou que os flagelos destruidores seriam responsáveis por “emigrações” ou “partidas coletivas”, promovendo a renovação da população do globo pela introdução de novos elementos espirituais mais depurados (A Gênese, Cap. XI, item 34). Operariam mesmo como catalisadores das mudanças:

“As renovações rápidas e quase instantâneas que se operam no elemento espiritual da população, em consequência dos flagelos destruidores, aceleram o progresso social; sem as emigrações e imigrações que vêm, de tempos em tempos, dar-lhe um violento impulso, ele avançaria com extrema lentidão.” (A Gênese, Cap. XI, item 34)

“Assim se realiza a transformação da humanidade. Sem a emigração, isto é, sem a partida dos Espíritos retardatários (...) seriam necessários séculos e séculos e talvez milhares de anos para chegar ao resultado que um meio século bastará para realizar.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 30).

“As grandes emigrações coletivas não têm como única finalidade promover as saídas, mas também transformar mais rapidamente o Espírito da população, libertando-a das más influências e dando superioridade às ideias novas.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 32).

“É o que se nota quase sempre após as grandes calamidades dizimarem as populações. Os flagelos destruidores destroem apenas os corpos, mas não atingem o Espírito. Eles ativam o movimento de ingresso e saída entre o mundo corporal e o espiritual e, por conseguinte, o movimento progressivo dos Espíritos encarnados e desencarnados. É de se notar que, em todas as épocas da história, às grandes crises sociais se seguiram eras de progresso.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 33).

É o que se constata também no item 737 de O Livro dos Espíritos:

“737 Com que fim fere Deus a Humanidade por meio de flagelos destruidores?
Para fazê-la progredir mais depressa. Já não dissemos ser a destruição uma necessidade para a regeneração moral dos Espíritos, que, em cada nova existência, sobem um degrau na escala do aperfeiçoamento? Preciso é que se veja o objetivo, para que os resultados possam ser apreciados. Somente do vosso ponto de vista pessoal os apreciais; daí vem que os qualificais de flagelos, por efeito do prejuízo que vos causam. Essas subversões, porém, são frequentemente necessárias para que mais pronto se dê o advento de uma melhor ordem de coisas e para que se realize em alguns anos o que teria exigido muitos séculos.”

Kardec reconhece essa específica atuação da lei de destruição para a fase presente de provas e expiações a caminho da plena regeneração:

“Atualmente, um desses movimentos gerais é operado, destinado a promover a reorganização da humanidade. A multiplicidade das causas da destruição constitui um sinal característico dos tempos, porque essas causas aceleram o surgimento dos novos germens. São as folhas que caem no outono, e isso será substituído por outras folhas cheias de vida, porque a humanidade tem suas estações assim como os indivíduos têm suas diferentes idades. As folhas mortas da humanidade caem impulsionadas pelas rajadas e sopros do vento, mas para renascer mais vigorosamente, pelo mesmo sopro de vida, que não se extingue, mas purifica.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 34).

Específica comunicação espiritual publicada na Revista Espírita de outubro de 1866 afirma que flagelos e calamidades apressarão a renovação:

“Infelizmente, por desconhecer a voz de Deus, a maioria persistirá em sua cegueira e sua resistência marcará o fim de seu reino por lutas terríveis. Em seu desvario, eles próprios cavarão a sua ruína; impelirão à destruição, que engendrará uma porção de flagelos e calamidades, de sorte que, sem o querer, apressarão o advento da era da renovação.
E como se a destruição não marchasse bastante depressa, ver-se-ão os suicídios multiplicando-se em proporção nunca vista, até entre as crianças. A loucura jamais terá ferido maior número de homens que, mesmo antes da morte, serão riscados do número dos vivos. São estes os verdadeiros sinais dos tempos. E tudo isto se realizará pelo encadeamento das circunstâncias, assim como dissemos, sem que em nada sejam derrogadas as leis da Natureza.”[24]

É preciso ter em mente que Kardec não apenas considerou a atuação dos flagelos destruidores, mas também os alinhou entre os agentes de constituição da “geração nova” (vide A Gênese, Cap. XVIII, itens 32 e ss.). Esta particularidade pode ser bem compreendida com o auxílio de comentários publicados na já citada Revista Espírita de outubro de 1866. Tenha-se o seguinte trecho para análise:

“Eis por que muitos partem, a despeito de suas imperfeições, a fim de se retemperarem numa fonte mais pura, porque estão maduros para esta transformação. Se tivessem ficado no mesmo meio e sob as mesmas influências, teriam persistido em suas opiniões e em sua maneira de ver as coisas. Basta uma estada no mundo dos Espíritos para lhes abrir os olhos, porque aí veem o que não podiam ver na Terra. O incrédulo, o fanático, o absolutista poderão, assim, voltar com ideias inatas de fé, de tolerância e de liberdade. Em seu regresso, encontrarão as coisas mudadas e sofrerão o ascendente do novo meio onde nascerem. Em vez de fazer oposição às ideias novas, serão seus auxiliares.
(...) Nem sempre os que voltarem serão outros Espíritos, mas, muitas vezes, os mesmos Espíritos, pensando e sentindo diversamente.
Quando essa melhora é isolada e individual, passa desapercebida e não tem influência ostensiva no mundo. Outro será o efeito, quando operada simultaneamente em grandes massas, porque, então, conforme as proporções, em uma geração as ideias de um povo ou de uma raça poderão ser modificadas profundamente.
É o que se nota quase sempre depois dos grandes abalos que dizimam as populações. Os flagelos destruidores só destroem o corpo, mas não atingem o Espírito; ativam o movimento de vaivém entre o mundo corporal e o mundo espiritual e, em consequência, o movimento progressivo dos Espíritos encarnados e desencarnados.
É um desses movimentos gerais que se opera neste momento, e que deve desencadear o remanejamento da Humanidade. A multiplicidade das causas de destruição é um sinal característico dos tempos, porque deve apressar a eclosão dos novos germes. São as folhas de outono que caem, e às quais sucederão novas folhas, cheias de vida, pois a Humanidade tem as suas estações, como os indivíduos as suas idades. As folhas mortas da Humanidade caem, levadas pela ventania, para renascer mais vivazes, sob o mesmo sopro de vida, que não se extingue, mas se purifica.”[25]

Sintetizando o raciocínio, a geração nova será formada pelo renascimento de espíritos despertos no mundo espiritual e que estarão amadurecidos para a transformação. Eles encontrarão no plano da carne um novo contexto e serão receptivos às influências benéficas. Contudo, uma alteração desse teor, se ocorresse em menor escala passaria sem impactos de relevo no planeta. Por isso é que Kardec vislumbrou esse processo atuando sobre “grandes massas”. No Livro dos Espíritos fez-se a seguinte comparação com desencarnes pontuais: “A única diferença, em caso de flagelo, é que maior número parte ao mesmo tempo” (item 738). E dentre a “multiplicidade das causas de destruição” estariam os flagelos destruidores, a promover partidas coletivas de espíritos e, por conseguinte, a renovação da população do globo pela introdução, em larga escala, de novos elementos espirituais mais depurados. Nas palavras do mesmo mestre, os flagelos destruidores “ativam o movimento de vaivém entre o mundo corporal e o mundo espiritual”. Kardec certamente concluiu pela necessidade de esclarecer que esses eventos não deveriam causar assombro. Explicou, pois, que os flagelos só destroem o corpo, mas não atingem o Espírito e estabeleceu uma comparação de tais movimentos com “as folhas de outono que caem”, “às quais sucederão novas folhas, cheias de vida.” Segundo O Livro dos Espíritos, “tão terríveis flagelos não nos pareceriam mais do que passageiras tempestades no destino do mundo” (item 738). A participação dos “flagelos destruidores” será em tópico próprio relacionada a duas espécies de “ritmos” que dirigem a evolução humana, conforme os ensinamentos de Kardec. Esse é assunto geralmente sonegado em leituras sobre o tema, mormente quanto ao estudo do texto “Regeneração da Humanidade” contido no livro Obras Póstumas (2ª Parte, Cap. 27).

Entendido, pois, que de acordo com a revelação espírita não devem ser inseridos os cataclismos gerais ao longo da grande tribulação, cabe considerar outros eventos geralmente associados ao período. Adela Yarbro Collins e Grant Osborne informam que as aflições dizem respeito à perseguição ao “povo santo”.[26] De acordo com Dale Allison, para a tradição judaica um dos temas centrais é o julgamento.[27] Estudiosos defendem que a teologia paulina relaciona o tempo da grande tribulação aos “ais” do Apocalipse.[28] P. G. Temple sugere que o interregno está relacionado a 1260 anos de perseguição papal[29], leitura esta que poderá ser melhor compreendida pelos comentários tecidos ao longo do estudo.

O sentido mais específico da “grande tribulação” pode ser depreendido dos ensinamentos de Jesus. Segundo a nossa leitura, a mais precisa manifestação do Cristo neste sentido está no Sermão Profético. Permita-se, com o objetivo de análise, destacar novamente o que consta no Evangelho de Mateus:

“Logo após a tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão do céu e os poderes dos céus serão abalados. Então aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem e todas as tribos da terra baterão no peito e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e grande glória. Ele enviará os seus anjos que, ao som da grande trombeta, reunirão os seus eleitos dos quatro ventos, de uma extremidade até a outra extremidade do céu.” (Mt 24:29-31)

Nos termos dessa passagem, após a tribulação, ou seja, já no seu fim, concretizar-se-ia a simbólica manifestação do Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e grande glória e com a reunião dos eleitos dos quatro ventos, de uma extremidade à outra do céu. Ocorre que esse símbolo, segundo a leitura que será apresentada oportunamente, corresponde à vinda do Espiritismo, também indicada em Ap 14:14 e ss. e Ap. 19:11 e ss. Logo, a grande tribulação terminou paralelamente à notável manifestação espiritual que consolidou os pilares do Espiritismo, que é o Consolador Prometido pelo Cristo (Jo 14:15 e ss.). Corrobora esta conclusão o seguinte trecho do discurso de Pedro à multidão, contido em Atos dos Apóstolos:

“Sucederá nos últimos dias, diz o Senhor, que derramarei do meu Espírito sobre toda carne. Vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos jovens terão visões e vossos velhos sonharão. Sim, sobre meus servos e minhas servas derramarei do meu Espírito. E farei aparecerem prodígios em cima, no céu, e sinais embaixo, sobre a terra. O sol se mudará em escuridão e a lua em sangue, antes que venha o Dia do Senhor, o grande Dia.” (At 2:17-20)

Ao longo deste estudo será possível compreender que a grande tribulação corresponde ao período de domínio da besta apocalíptica, por 1260 anos.

Questão diversa está em saber: (i) se as dores e aflições que marcam a fase de planeta de provas e expiações estão abrangidas pelo período do Apocalipse; (ii) se as vicissitudes típicas do período de provas e expiações estão todas inseridas na fase da grande tribulação, de acordo com a previsão mediúnica de João; (iii) se os eventos da grande tribulação correspondem, e em que medida, aos símbolos das sete taças (Ap 16).

Para esses questionamentos faz-se necessário breves apontamentos sobre o período de provas e expiações. Pela sistematização proposta por Allan Kardec, considerando-se o estado em que se encontram seus habitantes, os planetas podem ser divididos, de modo geral, por:

“(...) mundos primitivos, destinados às primeiras encarnações da alma humana; mundos de expiação e provas, onde domina o mal; mundos de regeneração, nos quais as almas que ainda têm o que expiar haurem novas forças, repousando das fadigas da luta; mundos ditosos, onde o bem sobrepuja o mal; mundos celestes ou divinos, habitações de Espíritos depurados, onde exclusivamente reina o bem.” (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. III, item 4).

A Terra encontra-se situada no paradigma de provas e expiações a caminho da fase de regeneração. Sobre o tema, anota Allan Kardec:

“A época atual é a da transição, os elementos das duas gerações se confundem. Colocados no ponto intermédio, assistis à partida de uma e a chegada da outra, e cada uma já se assinala no mundo pelos caracteres que lhe são próprios.” (Obras Póstumas, 2ª Parte, Cap. 27).

No mesmo texto, dá-se a entender que o planeta se encontrava em “trabalho de gestação da regeneração” há um século, contado daquela época - 25 de abril de 1866 (Obras Póstumas, 2ª Parte, Cap. 27), ou seja, aproximadamente desde 1766.

Foi visto, anteriormente, que as dicas de Emmanuel situam o período do Apocalipse a partir do desencarne de João Evangelista. Será demonstrado, em separado, que o Apocalipse termina apresentando traços característicos de um mundo ditoso, passando-se, obviamente, pela fase de regeneração. Dessa forma, é autorizado concluir que as dores e aflições que marcam a fase de planeta de provas e expiações estão abrangidas pelo período do Apocalipse.

Por sua vez, cabe considerar que as vicissitudes típicas do período de provas e expiações não estão todas inseridas na fase denominada de grande tribulação. Em outras palavras, as tribulações relativas ao domínio da besta apocalíptica por 1260 anos não são aos únicas abrangidas pelo lapso temporal objeto do Apocalipse. Do ponto de vista da revelação atual, tenha-se que desde as manifestações compiladas por Allan Kardec os espíritos previram para a regeneração as múltiplas causas de “destruições que darão origem a um sem-número de flagelos e de calamidades” (Obras Póstumas, 2ª Parte, Cap. 27). Igualmente, a mediunidade de Francisco Cândido Xavier adverte para a grande probabilidade de uma terceira guerra mundial, contexto no qual o Brasil acolheria inúmeros sobreviventes. Uma vez que o Apocalipse se encerra com a apresentação de um planeta ditoso ou, no mínimo, de um planeta regenerado, é evidente que eventos turbulentos dessa natureza somente poderão se situar em momento intercalar (e.g., Is 7:16). Lado outro, do ponto de vista das escrituras é preciso atenção sobre (i) a retribuição em dobro aos desvios humanos (Ap 18:6, Is 40:2, Jr 16:18, Ex 22:9), que aponta para dois tipos de queda; (ii) as quedas, nessa dupla perspectiva, previstas para a Grande Babilônia, a besta apocalíptica  (Dn 8:25) e o dragão; (iii) a batalha simbólica de Gog e Magog (Ap 20:8, Jr 46:10) igualmente em dupla perspectiva a ser explicada detidamente; (iv) a previsão de um novo êxodo, em moldes modernos; (v) a purificação, em todos os seus sentidos, representada pela fumaça espargida através do turíbulo (e.g., Ap 8:3, Ex. 30:1 e ss.); (vi) o vaticínio para a Jerusalém do plano concreto (Lc 19:39-44). Todos esses pontos podem auxiliar na compreensão do intervalo entre o fim da grande tribulação e os primeiros momentos da Nova Jerusalém. Sustenta-se que a revelação espírita é essencial para compreender esse interregno. Vale destacar que as manifestações espirituais catalogadas pela pesquisa de Allan Kardec previram a extensão do “dia da expiação” para período posterior ao término da grande tribulação: “Orai, pois, por esses endurecidos, a fim de que se emendem enquanto é tempo, pois o dia da expiação está próximo.”[30] A mediunidade de Francisco Cândido Xavier, por sua vez, também permite identificar a possibilidade de relevantes flagelos e calamidades para período estendido.

Caberia questionar se esse intervalo de dificuldades não estaria representado pelo simbólico fel derramado pelas sete taças previstas no capítulo 16 do Apocalipse. Entendemos que tais taças estão imediatamente relacionadas aos eventos que integram a grande tribulação, ressalvada a peculiaridade da sétima taça, que representa o desfecho, especificamente pela consolidação do Espiritismo no planeta. A avaliação do conteúdo de cada uma, a ser realizada quando do estudo do capítulo 16, permitirá compreender o raciocínio. Isso não significa, por outro lado, negar que esses eventos irão repercutir no tempo e para outros âmbitos relacionados à ação da besta apocalíptica.

Em resumo, pode-se responder aos questionamentos acima da seguinte maneira: (i) as dores e aflições que marcam a fase de planeta de provas e expiações estão abrangidas pelo período objeto do Apocalipse, pois se extinguem face a concretização da Nova Jerusalém; (ii) as vicissitudes típicas do período de provas e expiações não se resumem aos eventos da grande tribulação. Em sentido próprio ou específico, a grande tribulação corresponde ao período de domínio da besta apocalíptica, por 1260 anos. O período de provas e expiações é mais amplo; (iii) as sete taças previstas no capítulo 16 do Apocalipse estão diretamente associadas ao período da grande tribulação. Assim, estão imediatamente relacionadas ao período de domínio da besta apocalíptica. Nessa linha, a grande tribulação terminou paralelamente à consolidação do Espiritismo, que é o Consolador Prometido pelo Cristo. Também confirma essa leitura o que consta em Gênesis 9:14-17:

“Quando eu reunir as nuvens sobre a terra e o arco aparecer na nuvem, eu me lembrarei da aliança que há entre mim e vós e todos os seres vivos: toda carne e as águas não mais se tornarão um dilúvio para destruir toda carne. Quando o arco estiver na nuvem, eu o verei e me lembrarei da aliança eterna que há entre Deus e os seres vivos com toda carne que existe sobre a terra. Deus disse a Noé: ‘Este é o sinal da aliança que estabeleço entre mim e toda carne que existe sobre a terra.’”

No momento adequado serão avaliadas as frequentes menções, no Apocalipse, às nuvens (= presença espiritual superior - Ap 1:7, 10:1, 11:12, 14:14-16), ao arco ou arco-íris (= diversidade em reunião fraternal, projetada pela mente do Cristo - Ap 4:3, 6:2, 10:1), cujas cores remetem aos alicerces da Nova Jerusalém (Ap 21:18-22), símbolos que se entrelaçam no contexto da vinda do Espiritismo, que significa um novo momento da aliança eternamente ofertada por Deus para os homens.

Neste estudo defende-se a leitura de que todos os eventos da grande tribulação, bem como as sete taças, surtiram efeitos para o interregno que se estende até o início da Nova Jerusalém. A revelação espírita auxilia sobremodo no entendimento deste intervalo.

IV - O individual, o coletivo e dois “ritmos” da marcha evolutiva

Foi previsto que o “Evangelho do Reino” seria proclamado ao mundo inteiro, como testemunho para todas as nações, antes do chamado “fim dos tempos” (Mt 24:14).

No Evangelho de Lucas são apresentadas dicas simbólicas sobre o “grande dia”, em que o “Filho do Homem” seria revelado (Lc 17:30). As ilustrações ali descritas (Lc 17:24) amoldam-se adequadamente ao que consta em Ap 16:18, o que será objeto de comentários pontuais. Antes desse tão esperado momento, a “Boa Nova do Reino de Deus” (At 8:12) seria rejeitada por muitos (Lc 17:25).

Os homens do tempo de Jesus ansiavam pela vinda do “Reino de Deus”, cuja boa notícia recebiam naquela oportunidade. No livro Boa Nova, da autoria espiritual de Humberto de Campos e da lavra mediúnica de Francisco Cândido Xavier, a expressão “Evangelho do Reino” é mencionada algumas vezes, em contextos que atestam aquela esperança quanto à vinda dos maravilhosos dias de efetiva concretização das leis divinas na Terra. Seguem alguns exemplos:

“Os apóstolos criam contemplar o glorioso porvir do Evangelho do Reino e estremeciam do júbilo de seus corações.”[31]

“Eram anciães que confiavam no Cristo, mulheres que por ele haviam desprezado o conforto do lar, jovens que depunham no Evangelho do Reino toda a sua esperança.”[32]

São inúmeras as lições de Jesus a respeito da vinda do Reino de Deus, que podem ser bem compreendidas nesta síntese: o “Reino é a obra divina no coração dos homens”.[33] Esse é um percurso inegavelmente individual.

A conduta dos homens, todavia, também pode ser observada pela ótica coletiva. O comportamento das coletividades é igualmente relevante para a avaliação da evolução espiritual no planeta. A vida prática demonstra que num conjunto de aprendizes existem aqueles que se destacam, que se apresentam acima da média e por vezes são comparados ao “ponto fora da curva”. Podem ser até mesmo promovidos para etapas adiantadas, a depender do sistema que rege a sua realidade. Paralelamente, persistem os grupos dos aprendizes que geralmente caminham em conjunto e seguem o padrão médio, mais ou menos homogêneo. Nesse contraponto entre os passos individuais e os coletivos pode-se compreender a seguinte manifestação de Paulo, contida na Primeira Epístola aos Coríntios:

“Estas coisas lhes aconteceram para servir de exemplo e foram escritas para a nossa instrução, nós que fomos atingidos pelo fim dos tempos.” (1 Co 10:11)

O que se extrai da passagem é que os tempos já seriam chegados para alguns, que se adiantaram na marcha. São aqueles que já estão a edificar o paraíso dentro de si mesmos, como aponta Emmanuel.[34] Está pressuposto naquele pensamento de Paulo que ao lado destes poucos que avançaram persistiria um grupo maior para o qual o fim dos tempos chegaria posteriormente. Seria o mesmo que dizer: “para nós já são chegados o ´fim dos tempos´, enquanto que para grande contingente de pessoas esse período se verificará no futuro”.

No Apocalipse a figura da Nova Jerusalém, representativa da humanidade redimida, é apresentada com evidente ênfase coletiva. Indicam essa realidade expressões como “porque o Senhor, o Deus Todo-poderoso, passou a reinar” (Ap 19:6), “eis a tenda de Deus com os homens” (Ap 21:3), “eles serão o seu povo” (Ap 21:2), “as nações caminharão à sua luz” (Ap 21:24), dentre tantas outras.

A ênfase coletiva está evidenciada pela dica interpretativa de Emmanuel, no livro A Caminho da Luz:

“Recomenda-lhe o Senhor que entregue os seus conhecimentos ao planeta como advertência a todas as nações e a todos os povos da Terra, e o velho Apóstolo de Patmos transmite aos seus discípulos as advertências extraordinárias do Apocalipse.”[35]

Vale destacar que é Emmanuel quem esclarece ser o Apocalipse uma séria advertência destinada “a todas as nações e a todos os povos da Terra”.

A abordagem coletiva também se encontra em estreita sintonia com anotações de Allan Kardec sobre elementos típicos da transição planetária e da constituição da geração nova, tais como os flagelos destrutivos, as partidas coletivas e a conjugação de dois “ritmos” da marcha evolutiva. Inicie-se pela consideração deste último, conforme os seguintes trechos colhidos do livro A Gênese:

“Como temos dito, a marcha progressiva da humanidade se opera de duas maneiras:  uma gradual, lenta e imperceptível, considerando as épocas próximas, representada por melhoramentos nos costumes, nas leis, nos hábitos, apenas evidentes com o tempo, como as mudanças na superfície do planeta causadas pelas correntes de água na superfície do globo; a outra, por movimentos relativamente bruscos, rápidos, como de uma torrente, que, rompendo seus diques, transpõe em alguns anos o espaço que levaria séculos para percorrer.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 11).

“A humanidade é um ser coletivo, onde se operam as mesmas revoluções morais que ocorrem nos indivíduos, com a diferença de que com estes ocorrem de ano a ano, e naquela de século em século. Nessas evoluções que se seguem através dos tempos, vemos a vida de diversas raças marcadas por períodos que dão a cada época uma fisionomia particular.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 9)

“Com os movimentos parciais existe um movimento geral que impulsiona a humanidade inteira.” (A Gênese, Cap. XVIII, item 9).

Parece adequado tecer um paralelo entre a proporção desses “ritmos” da marcha progressiva da Humanidade com os ângulos individual e coletivo. Não é raro encontrar-se estudos espíritas cingidos à perspectiva individual do Evangelho, sem a consideração de que os movimentos evolutivos também apresentam sua dimensão coletiva. Assim, a marcha gradual e lenta, que Kardec compara às mudanças que correntes d’água ocasionam na superfície do globo estão para as alterações promovidas por cada individualidade. Já as alterações céleres ou súbitas, ilustradas pelo mesmo autor com o exemplo da ação de uma torrente que rompe os diques que a continham, pende para os eventos coletivos. São duas realidades que se conjugam e, pois, não podem ser desprezadas. Kardec foi muito claro em suas considerações sobre a formação da geração nova, para a qual concorreriam também movimentos relativamente bruscos.

O grande sistematizador destaca impactos de proporções globais e comenta a possibilidade de “emigrações” ou “partidas coletivas” (e.g., Revista Espírita de outubro de 1866 – Instruções dos Espíritos; Sobre a regeneração da Humanidade; A Gênese, Cap. XVIII, itens 26, 30 e 32). Kardec conecta os flagelos destruidores a eventos que promovem chegadas e partidas coletivas, meios providenciais de renovação (A Gênese, Cap. XI, item 34).

É fora de dúvidas que o Evangelho centra foco na renovação individual. Conforme esclarecem Humberto de Campos e Emmanuel:

“O indivíduo é coluna sagrada no templo do Cristianismo.
(...)
Eis por que o Evangelho é a Carta do Mundo que glorificará a paz na Terra, depois de impressa no Coração do Homem.”[36]

“O homem cristianizado é a coluna viva da democracia futura em que o reinado da Ordem, na estrutura do Estado, não colidirá com o reino de Deus, em construção na individualidade humana.” [37]

Isso não significa, por outro lado, que na leitura do Apocalipse é autorizado o afastamento da atuação dos movimentos catalisadores que ensejam alterações coletivas e mais céleres ao longo da transição planetária. Isso seria o mesmo que fazer pouco das provações coletivas, motivo pelo qual se concluiu na mesma lição citada acima: “das angústias coletivas, entretanto, surgirão claridades renovadoras.”[38] O grande livro das revelações também foca o âmbito coletivo e as dicas interpretativas de Emmanuel apontam nesse sentido.

V - O abstrato e o concreto no Apocalipse

Kardec não se omitiu quanto à avaliação de muitas predições previstas no Evangelho. Ao contrário, teceu diversas considerações sobre previsões de Jesus no livro A Gênese, especificamente na sua terceira parte intitulada “As predições segundo o Espiritismo” (Capítulos XVI a XVIII). Ao comentar as passagens que se referem aos “fins dos tempos”, o dedicado compilador destacou uma diretriz interpretativa, que consiste em sacar a essência ou o “sentido íntimo” dessas palavras (A Gênese, Cap. XVII, item 60), partindo-se da compreensão de que apresentam alegorias:

“Esse quadro do fim dos tempos é evidentemente alegórico, como a maior parte daquilo que apresentava Jesus. As imagens que contêm são de natureza, por sua energia, que impressione as inteligências ainda rudes. Para impressionar essas imaginações pouco sutis, eram necessárias pinturas vigorosas, em cores nítidas.” (A Gênese, Cap. XVII, item 54).

“Entretanto, sob essas alegorias ocultam-se grandes verdades: primeiramente o anúncio das calamidades de todos os gêneros que atingirão a humanidade e a dizimarão; calamidades engendradas pela luta suprema entre o bem e o mal, a fé e a incredulidade, as ideias progressistas e as ideias retrógradas.” (A Gênese, Cap. XVII, item 56)

Certamente, essa é a linha central que deve conduzir a leitura do Apocalipse. É necessário compreender os sentidos profundos por detrás dos seus símbolos.

Lado outro, é importante compreender que existem passagens bíblicas desafiadoras quanto aos limites entre fatos concretos e sentidos figurados. Observe-se, por exemplo, o que consta em Lucas 19:39-44:

“Alguns fariseus da multidão lhe disseram: ‘Mestre, repreende teus discípulos.’ Ele, porém, respondeu: ‘Eu vos digo, se eles se calarem, as pedras gritarão.’
E, como se estivesse perto, viu a cidade e chorou sobre ela, dizendo: ‘Ah! Se neste dia também tu conhecesses a mensagem de paz! Agora, porém, isso está escondido a teus olhos. Pois dias virão sobre ti, e os teus inimigos te cercarão com trincheiras, te rodearão e te apertarão por todos os lados. Deitarão por terra a ti e a teus filhos no meio de ti, e não deixarão de ti pedra sobre pedra, porque não reconheceste o tempo em que foste visitada!”

É inegável a referência, na passagem em destaque, a eventos concretos. Conquanto apresente sentidos profundos, também remete à destruição de Jerusalém pela ação de Roma em 70 d.C.[39] Em comentários pontuais à passagem, Emmanuel aduz o seguinte:

“A exclamação de Jesus, junto de Jerusalém, aplica-se muito mais ao coração do homem – templo vivo do Senhor – que à cidade de ordem material, destinada à ruína e à desagregação nos setores da experiência.”[40]

Novamente, o foco principal dos ensinamentos de Jesus está na individualidade. É preciso convir, todavia, que o comentário em destaque também considera a referência aos destinos da cidade de Jerusalém no plano concreto. É esse o “menos” subtendido na colocação de Emmanuel. O próprio Kardec assumiu a relação de alguns símbolos a eventos verificados no plano dos fatos:

“De resto, algumas de suas predições cumpriram-se em seu tempo, tais como a ruína de Jerusalém, as maldições que se seguiram, e a dispersão dos judeus; mas ele leva sua visão mais longe e, falando do presente, ele faz constantemente alusão ao futuro.” (A Gênese, Cap. XVII, item 46).

Existe nos signos bíblicos, portanto, uma amálgama entre alegorias e eventos concretos que dificilmente será possível discernir com traço de régua. Um mesmo signo pode apresentar essa dupla perspectiva de guardar um significado aberto com sentidos morais profundos ao mesmo tempo em que consiste numa previsão possível para eventos pontuais. O transcurso do tempo e o confronto com o plano dos fatos serão sempre parâmetros para a avaliação integral das várias possibilidades inerentes aos textos bíblicos.

Especialmente para o livro do Apocalipse, cabe levar em conta essa perspectiva multifacetada. Sob a ótica da mediunidade de presciência, chama-se a atenção para a previsão de uma retribuição em dobro face os descaminhos humanos (Ap 18:6, Is 40:2, Jr 16:18, Ex 22:9). Sustentamos a tese de que essa retribuição em “paga dobrada” permite compreender os signos do Apocalipse sob dois ângulos, o das alegorias profundas com significados gerais ao lado de significados que pendem para o campo das previsões pontuais e mais concretas. Assim é que, nessa linha, sustentaremos em dupla perspectiva (i) as quedas previstas para a Grande Babilônia, a besta apocalíptica e o dragão; (ii) os significados por detrás das sete taças (Ap 16); (iii) a batalha simbólica de Gog e Magog (Ap 20:8, Jr 46:10), dentre outros signos que serão comentados oportunamente.

Além disso, é possível extrair dos símbolos do Apocalipse significados diretos, relativos ao sentido espiritual imediato, bem como significados reflexos, neste último caso tal como se verifica com efeitos de atos. Veja-se que um ato é significativo pelo que representa em sua delimitação própria e também em virtude dos efeitos que esparge. Assim é que o desvio da missão de uma “Jerusalém”, no âmbito da religiosidade, merece detida reflexão do ponto de vista dos efeitos que ocasiona na realidade. É de se questionar, por exemplo, para além dos principais sentidos por detrás das sete taças (Ap 16), quais são os recados guardados em amálgama com elementos do plano dos fatos e, principalmente, seus possíveis efeitos reflexos. Se é verdade que existe uma simbologia profunda por detrás da taça derramada sobre o grande rio Eufrates, causando a sua secura e, por conseguinte, abrindo caminho para os reis do Oriente (Ap 16:12), por outro lado não parece sem propósito os sentidos que defluem da previsão considerando-se tudo o que a região representa no plano dos fatos, tanto no seu passado quanto na atualidade. Do ponto de vista dos significados reflexos o derramamento da taça sobre o Eufrates pode significar mais do que os sentidos pretéritos das escrituras permitem concluir. Se é fato que o disposto em Ap 9 guarda um sentido essencial a partir da intertextualidade com as escrituras bíblicas, não se pode deixar de considerar a verossimilhança das descrições ali contidas com engenhos de guerra modernos. Tenha-se, a título de último exemplo para esta análise panorâmica, o símbolo das várias Babilônias pela linha do tempo. Abstratamente é possível enquadrar a figura da Babilônia com a ação do círculo laico, em antítese com o âmbito da religiosidade. O fato é que comunidades do plano concreto fizeram as vezes das várias Babilônias, como se conclui pela leitura dos símbolos contidos no livro de Daniel. E, sem embargo do sentido abstrato ou puramente conceitual, entendemos que alguns apontamentos de Emmanuel permitem situar a Europa como a icônica e derradeira Babilônia.

Adotamos neste estudo, portanto, a posição de abertura para todos os sentidos que possam estar intencionalmente preservados nos símbolos do Apocalipse.

VI - Os principais entes do Apocalipse

Sustentamos, em apertada síntese, que o Apocalipse apresenta quatro “personagens” principais, designadamente: (i) a prostituta (= besta apocalíptica); (ii) o dragão; (iii) a Grande Babilônia e (iv) a Nova Jerusalém. Toda a narrativa do livro das revelações gira em torno dessas quatro “entidades”, o que demonstra a definição de uma mensagem específica a ser transmitida e, por sua vez, a existência de um foco temático que serve de baliza à interpretação.



O devido aprofundamento dessas figuras será tratado ao longo dos comentários que seguem. A título de introdução, deve-se ter em conta que a prostituta indica o institucionalismo religioso que em todos os tempos desviou os ensinamentos de Jesus por nele inserir concepções conduzidas pelos interesses humanos. O dragão está relacionado ao mal em grau extremado, presente desde o coração e as mentes dos homens, sejam encarnados ou desencarnados, e que nos seus primórdios se apresentou como a serpente (e.g., Gn 3:1, Ap 20:2). Uma das mais evidentes demonstrações da maldade humana está nas guerras destrutivas, daí o motivo pelo qual neste estudo será realizada frequente menção ao “dragão da guerra”. A Grande Babilônia é símbolo que indica a “última associação dos gentios”, agrupamento responsável por suster, até a sua extinção, a cultura materialista que se contrapõe aos ensinamentos espirituais. Como se verá adiante, essas três entidades “misturam-se por casamentos”, para empregar a expressão contida em Dn 2:43, conforme a projeção prevista para os “últimos tempos”. Por fim, a Nova Jerusalém é a última do ciclo. Ao contrário das “Jerusaléns” anteriores, marcadas pela defecção e pela traição da aliança para com Deus, essa última representa a humanidade regenerada, na qual as leis divinas serão efetivamente observadas.

A prostituta, o dragão e a Grande Babilônia dominam na fase obscura prevista no Apocalipse, até o desfecho da grande tribulação. Conforme indica o texto, estes se extinguem para o surgimento da Nova Jerusalém.

VII -Recursos de forma no Apocalipse. O Apocalipse em perspectiva cíclica

Sem adentrar nos extensos debates que rondam a relação entre conteúdos e os variados meios para sua apresentação, é importante notar que o texto do Apocalipse opta por modulações específicas, que são recursos de forma para chamar a atenção do leitor. Especificamente, o livro em estudo apresenta símbolos em oposição ou confronto para destacar dualidades significativas.

Mesmo que não se atente para a estrutura do texto, uma avaliação semântica, de acordo com a significação dos símbolos, já permite compreender que a narrativa do Apocalipse se desenvolve sobre contrapontos. Assim é que ao período da grande tribulação (Ap 6:8, 7:14, 14:7, 15:1, 16) segue-se o estabelecimento do Reino de Deus (Ap 19:6, 22:5). O primado das leis divinas, por sua vez, vem após o “reinado” da grande prostituta (Ap 17:18). A Grande Babilônia (Ap 11:8, 14:8, 18:16) e a Cidade dita Santa (Ap 11:2) serão sucedidas pela Nova Jerusalém, efetivamente “santificada” (Ap 21:2). A prostituta, a magna besta do Apocalipse (Ap 17, 18) é contraposta pela esposa do Cordeiro-Jesus (Ap 21:2, 21:9). O período de domínio da prostituta, do dragão e da Grande Babilônia termina com a extinção desses entes (Ap 18, 19, 20). A aliança espúria (Ap 17; Dn 2:43) confronta-se com a aliança espiritual (Ap 21:2, 21:9). A associação das animalidades (Ap 12:2) encontra antítese na união fraterna entre as nações (Ap 21:19, Ex 28:17-20, 39:10-19). A coroa inferior, prêmio estranho concedido aos que prevalecem pelos desvios do mundo (Ap 9:7, 12:3, 13:1) é contraposta à tiara dos que vencem pelo espírito (Ap 6:2, 14:14, 19:12). O livro enrolado, representativo do período de trevas (Ap 6:14) contrasta com os livros abertos, indicativos da retomada da inspiração superior (Ap 20:12). A abertura do sexto selo revela conteúdos sobre a grande tribulação, quando se questiona quem poderia ficar de pé (Ap 6:17). Ap 11:11, por outro lado, indica que após a fase de tribulação um sopro de vida viria de Deus situando os homens de pé. O vinho do furor e da prostituição, representativo dos desvios à custa das coisas santas e que embriagou os traidores da aliança (Ap 14:8,9; 16:6, 16:19, 17:2, 17:6, 18:3, 18:6) é substituído conforme a nova vindima da terra, a resultar em vinho/sangue limpo, com a retirada das criações humanas (Ap 14:19,20). A fumaça purificadora, proveniente do incenso e que sai do simbólico turíbulo (Ap 8:4,5, 5:8, 15:8) contrasta com a fumaça que sobe da destruição de entes significativos do Apocalipse (Ap 14:11, 18:9, 18:17, 19:3). O monte, enquanto acúmulo de riquezas (Ap 17:9), contrapõe-se ao monte que significa elevação da sintonia (Mt 24:16). O dragão e seus anjos (Ap 12:7) estão em confronto com Miguel e seus anjos (Ap 12:7). Gogue e Magogue (Ap 20:8) tensionam com o arraial dos santos (Ap 20:9).









 











O texto do Apocalipse desdobra-se em narrativas que podem ser chamadas de circulares, uma vez que centradas em temas que se repetem, o que encontra fundamento na tradição oral da época.[41]

A título de exemplo, cabe citar a frequente menção ao símbolo das nuvens (Ap 1:7, 10:1, 11:12, 14:14-1), que representa a presença espiritual superior em específicos momentos da humanidade.

A serpente mencionada logo em Gn 3:1, que os responsáveis pela Bíblia de Jerusalém identificam como um “ser hostil a Deus”[42], desdobra-se na figura do dragão, a indicar a ampliação e o desenvolvimento do mal.






Também são identificados desdobramentos de símbolos que apresentam uma interconexão. É o caso daqueles que dizem respeito à concretização do Espiritismo no planeta. Assim é que relâmpagos, vozes e trovões, símbolos da manifestação espiritual pela via mediúnica, estão presentes em Ap 4:5, 6:1, 11:19, 19:6. O Espírito da Verdade, anunciado por Jesus (Jo 14:15 e ss.) e que atuou como reitor dos trabalhos de Kardec, pode se identificado em Ap 14:5, 14:2. O momento oportuno para a vinda do Espiritismo encontra-se ilustrado na vindima dos cachos da vinha da terra (Ap 14:17). O trabalho no lagar (Ap 19:11-17) corresponde aos esperados esforços de divulgação e internalização da mensagem espírita. A reconexão à verdade (Ap 20:11), simbolizada pela definitiva abertura dos livros, consiste num dos efeitos do Espiritismo no planeta. João entrevê as revelações codificadas pelo símbolo dos “sete trovões” e, quando estava para as anotar, foi interrompido pelo espírito comunicante, que lhe informou sobre a necessidade de “selar’’ ou manter em segredo aquelas informações até o momento em que o sétimo anjo tocasse a trombeta, oportunidade em que o “mistério de Deus” estaria consumado (Ap 10:3-7). A sétima trombeta, referida na passagem em comento, anuncia o fim da tribulação, após o julgamento do Grande Dia (Ap 11:15-19), contexto esse que indica o período antevisto para a vinda do Espiritismo, o que será avaliado em comentários específicos.

Ainda sobre o desdobramento de símbolos conexos, atente-se para a figura do cavalo branco, cujo montador tinha um arco (Ap 6:2). É possível enxergar, aqui, referência a um instrumento de batalha. O fato, entretanto, é que outras passagens convidam a concluir em sentido diverso. O espírito de superior condição mencionado em Ap 4:2 sentava-se sobre um trono envolvido por um arco-íris. Novamente, o arco-íris surge sobre a cabeça de elevada entidade mencionada em Ap 10:1-2. Conforme demonstraremos no momento adequado, interpretamos as imagens como a pessoa de Jesus que desde o início manifesta mentalmente o seu projeto de unir todas as “cores”, as mesmas presentes nas pedras que constituem os alicerces da Nova Jerusalém. Essas pedras, por sua vez, representam cada uma das doze tribos que formaram a Jerusalém, conforme a dica interpretativa de Ex 28:17-20; 39:10-19. São as pedras simbólicas que estavam presentes no Éden (Ez 28:13). Sob a Nova Jerusalém, as pedras representam a união fraternal das etnias ou nações, concretizando, no final do Apocalipse, o projeto íntimo de Jesus manifestado desde o início da revelação. Chega-se à mesma conclusão quando se considera que o arco, em Gn 9:14-17, está relacionado à aliança com Deus.



As narrativas circulares do Apocalipse integram-no a um ciclo de símbolos presentes desde o Velho Testamento, conforme demonstrado nos tópicos anteriores. Isso não significa dizer que o próprio Apocalipse é cíclico, no sentido de que a linha da história da humanidade perpassa várias vezes por sua narrativa, tal como um veículo de corrida que completa voltas em torno da pista até a reta final. Em verdade, constata-se que o Apocalipse de João integra um ciclo maior, que vem sendo apresentado desde o livro de Gênesis. Ou seja, cuida-se de um último ciclo, no que diz respeito ao destino das “Jerusaléns” e das “Babilônias”. Por ele - o Apocalipse - a linha da história transcorre apenas uma vez. Para frisar o ponto: embora empregue narrativa circular, por repetição de símbolos, o grande livro das revelações não é cíclico. Ele integra uma linha de ciclos desdobrada em toda a Bíblia e, nesse encadeamento, ele é o último elo.

Assim, em perspectiva cíclica o Apocalipse aborda as duas últimas “Jerusaléns” e a última “Babilônia”, o que deve ser lido à luz da parábola dos lavradores maus (Mt 21:33-46, Mc 12-1-12, Lc 20:9-19). Quanto à primeira, foi dito que o símbolo vai além da Jerusalém propriamente dita, em suas várias fases de ascensões e quedas, o que abarca a significativa destruição do templo por três vezes (586 a.C, 70 d.C, 135 d.C).[43] Demonstrou-se, igualmente, a presença de um padrão simbólico nas escrituras de acordo com a seguinte sequência, apresentada em suas caraterísticas gerais: (i) investimento espiritual (= aliança) sobre os homens; (ii) defecção ou traição por parte dos que receberam os ensinamentos superiores; (iii) advertências sobre a necessidade de adequar o comportamento aos ensinamentos maiores; (iv) retribuição divina em virtude da renitência no erro. Pois bem, a última Jerusalém desvirtuada está presente no Apocalipse, e consiste na denominada prostituta, o institucionalismo romano que misturou ao “vinho puro” a “água” das concepções humanas inferiores. Após sua dissolução, surgirá a Nova Jerusalém. São duas, portanto, as Jerusaléns previstas no Apocalipse, a última desvirtuada e a que efetivamente triunfará. É possível, então, perceber uma projeção das “Jerusaléns”, desde a pequena comunidade que surge como depositária do investimento espiritual superior até a união fraternal de todas as nações sob a Nova Jerusalém. Percebe-se uma evidente expansão. O mesmo se verifica com o ciclo das “Babilônias”, de acordo com o já citado encadeamento simbólico presente nas escrituras: 1) Sodoma, 2) Egito, 3) Império Babilônico, 4) Império Medo-Persa, 5) Império Greco-Macedônico, 6) Império Romano, 7) Grande Babilônia, território de domínio da besta apocalíptica. Do início à dilatada Babilônia há também uma inegável expansão. Soma-se a essas projeções o comentado desdobramento da serpente em dragão.



Optou-se pelo termo projeção por permitir uma ilustração sobre o que sucedeu com o desdobramento dessas três entidades. Utilizando-se de uma expressão do livro de Daniel, pode-se dizer que a prostituta, a Grande Babilônia e o dragão misturam-se por casamentos (Dn 2:43), obviamente pelo regime da aliança inferior comentada anteriormente. É como uma simbiose obsessiva (Ap 17:8-13, Ap 12), que pode ser bem compreendida pelas relações explicadas por Emmanuel na obra A Caminho da Luz, estabelecidas entre o âmbito institucional-religioso e o círculo do poder temporal e com o concurso das influências espirituais. Assim, no ápice da grande tribulação os agentes em foco uniram seus destinos de forma a se confundirem. É esse sentido de relação que pode ser depreendido de Ap. 17, para cuja compreensão cabe vislumbrar três focos de projeção sobre uma mesma tela, a resultar em óbvio baralhamento de imagens. Enfim, a prostituta e a Grande Babilônia, mancomunados no mal, fundem-se pelo “solvente comum” do dragão.





Atentamos para esse sentido de projeção por intermédio da excelente obra de Wallace Oliveira, que explica o crescimento de outro símbolo importante presente para o Apocalipse, a pedra angular. Este autor elucida que o símbolo da montanha representa Deus, enquanto que a pedra destacada indica seus ensinamentos:

“Aquela figura bíblica do grande monte ou rocha simboliza o próprio Deus (Is 26:4), que é a verdade, enquanto a da pedra, que é uma parte daquela grande rocha, representa a palavra de Deus, a doutrina verdadeira do Cristo ou do Cristianismo, e que, conforme previsto no livro dos Salmos (Sl 118:22), embora fosse rejeitada pelos judeus de sua época (Mt 21:42, e At 4:11), iria crescer e se expandir por todo o mundo (Mt 13:31-32).”[44]

Essa pedra angular, por sua vez, tornou-se a grande montanha, que ocupou a terra inteira (Dn 2:34), uma vez que a “verdade divina iria crescer e elevar-se (Sl 118:22), se fazendo presente em todo o mundo”. [45] Essa é a pedra que colidiria contra a Grande Babilônia, conforme previsto em Ap 18:21, assim como as escrituras antigas previam que a pedra angular destruiria os elementos provenientes de mãos humanas (e.g., Is 8:14, 21:9, 28:17, 30:14), símbolos da idolatria e do desvio. A projeção da pedra angular, portanto, significa que no momento oportuno a verdade viria destruir os constructos humanos desvencilhados das leis que regem o cosmos.

Outro recurso de forma que direciona a perspectiva cíclica do Apocalipse consiste nas estruturas quiásticas identificáveis em vários níveis.

A noção de quiasmo deriva de χ (transliteração: chi), a vigésima segunda letra do alfabeto grego cujo formato lembra um “v” espelhado. Qual ocorre na imagem refletida e invertida no espelho, a estrutura da redação quiástica é, a partir de determinado ponto, reproduzida de forma invertida, suscitando contrapontos dos quais emergem sentidos importantes. Na estrutura de um quiasmo as unidades de uma seção são repetidas em ordem inversa às da outra.[46] Forma-se, pois, uma estrutura literária chamada de paralelismo antitético[47], na qual a última linha ou ideia corresponde com a primeira, a penúltima corresponde à segunda, e assim sucessivamente.[48] É geralmente constituído de palavras idênticas, cognatos ou construções similares.[49]

Recurso literário comumente empregado no mundo antigo, o quiasmo pode ser identificado na literatura sumero-acadiana, na literatura ugarítica, na Bíblia, nos livros apócrifos, no Novo Testamento, na literatura rabínica e também na literatura clássica.[50] Estudos discerniram 183 padrões quiásticos em Gênesis, 273 em Isaías , 441 em Salmos, 33 em Samuel, 11 em Reis, 10 em Crônicas e 3 nos livros de Esdras e Neemias.[51]

O objetivo do quiasmo é o de promover o contraste dialético.[52] Assim, pode ser concebido como espécie do gênero das antíteses. Nem sempre passagens que indicam contrapontos podem ser enquadradas no figurino em tela, para as quais o rótulo “quiástico” é empregado com certo abuso ou por falta de um termo melhor.[53]

No Apocalipse há um nítido emprego de símbolos que se contrastam e de quiasmos.[54] De Villiers propõe, por exemplo, que o intervalo de Ap 6:12 a 6:17 encerra um quiasmo, o que merece ser avaliado também para a ilustração do recurso. A divisão sugerida pelo autor é a seguinte:

A  Vi quando ele abriu o sexto selo: houve um grande terremoto; (Ap 6:12-a)

B o sol tornou-se negro como um saco de crina, e a lua inteira como sangue; (Ap 6:12-b)


C as estrelas do céu se precipitaram sobre a terra, como a figueira que deixa cair seus frutos ainda verdes ao ser agitada por um vento forte; o céu afastou- se, como um livro que é enrolado; as montanhas todas e as ilhas foram removidas de seu lugar; (Ap 6:13, 14)



D os reis da terra, os magnatas, (Ap 6:15-a)



E os capitães, os ricos e os poderosos, (Ap 6:15-b)



D’ todos, escravos e homens livres, (Ap 6:15-c)


C’ esconderam-se nas cavernas e pelos rochedos das montanhas, dizendo aos montes e às pedras: (Ap 6:15-d-16-a)

B’ Desmoronai sobre nós e escondei-nos da face daquele que está sentado no trono, e da ira do Cordeiro, (Ap 6:16-b)
A’ pois chegou o Grande Dia da sua ira, e quem poderá ficar de pé? (Ap 6:17).[55]

Note-se que no espelhamento típico da estrutura, A está relacionado a A’, B a B’, e assim por diante. O trecho trata do sexto selo, que aborda o julgamento divino (grande terremoto) durante o período da grande tribulação. Como todo quiasmo, no seu centro encontra-se um ponto que se quer destacar.[56] No caso, o trecho E realça os agentes centrais da grande tribulação, especialmente submetidos ao julgamento: os capitães, os ricos e os poderosos.

Muitas conexões são permitidas pelo quiasma em destaque, cuja análise não convém na oportunidade. Destaque-se apenas que o trecho C menciona o céu que se afastou como um livro que é enrolado, expressão que indica a inibição ao conhecimento superior, inclusive da mediunidade, no período trevoso de domínio da besta apocalíptica. Já o correspondente trecho C’ indica que a fuga para o interior das cavernas e para dentro de rochedos diz respeito ao conhecimento da verdade, restrito neste interregno.

Quiasmos podem apresentar dimensões diversas, em regime de gradação.[57] Em sentido amplo, a integralidade do texto do Apocalipse pode ser enfocada pela ótica da estrutura quiástica, o que é reconhecido por um crescente número de estudiosos do tema.[58] Eliezer Gonzalez propõe a seguinte divisão:

A  Ap 1:1-8


B Ap 1:9-3:22



C Ap 4-8:1




D Ap 8:2 - 9:21




E Ap 10-11:18





F Ap 11:19-13:18




E’ Ap 14:1-20



D’ Ap 15-18:24


C’ Ap 19-21:4


B’ Ap 21:05-22:05

A’ Ap 22:6-21[59]


De acordo com essa proposta, no centro da estrutura quiástica do Apocalipse, indicada pelo trecho F, pode ser identificada a grande tribulação.

A compreensão das estruturas de forma do Apocalipse auxilia no entendimento de sua divisão, o que será realizado adiante.

VIII - O livro de Daniel e o Apocalipse

Muitos trechos da Bíblia são de grande importância para a leitura do Apocalipse, mas especial destaque deve ser dado à personalidade de Daniel.

Adela Yarbro Collins reconhece que “entre os textos que por boas razões podem ser classificados como apocalipses, apenas o livro de Daniel manifesta tal objetivo.”[60]

A associação entre o livro de Daniel e o Apocalipse é estabelecida pela mediunidade de Francisco Cândido Xavier, como se verá oportunamente. Pode-se afirmar que o Apocalipse é a “continuidade das revelações do livro de Daniel”.[61] Existe, assim, uma complementaridade entre esses livros, essencial para a tarefa interpretativa:

“Este princípio de unidade e complementaridade dos dois testemunhos é ainda mais significativo na medida em que constitui a base de como interpretar o Apocalipse. Sem o livro de Daniel, o Apocalipse permanece obscuro, não só em virtude de suas alusões numéricas e referências a Daniel, mas também porque ele compartilha a mesma perspectiva e usa a mesma língua, símbolos e relatos dos mesmos eventos proféticos.”[62]

Existem passagens que evidenciam a conexão entre o livro de Daniel e o Apocalipse de João, especificamente sobre onde termina uma revelação e onde se inicia a outra. Consta na primeira escritura que algumas visões somente poderiam ser compreendidas pelos espíritos superiores, “cuja morada não se encontra entre os seres de carne” (Dn 2:11). O mesmo pressuposto essencial para alcançar-se a verdade pela mediunidade de presciência é abordado no Apocalipse, quando se indaga: “quem é digno de abrir o livro, rompendo seus selos?” (Ap 5:2). Na sequência é explicado que somente Jesus, o Leão da tribo de Judá, o Rebento de Davi, o Cordeiro imolado, poderia sondar propriamente as informações seladas (Ap. 5:5,6). Apenas parte da profecia está contida em Daniel, conforme o anúncio de que fora “fechada e selada até o tempo do fim (Dn 12:4 e 9)”.[63] Jesus, portanto, rompe o lacre na comunicação mediúnica estabelecida com João, dando prosseguimento às previsões conforme contido no Apocalipse. Em outras palavras, Ap 5:5-14, 6 e ss. indica o prosseguimento da revelação, interrompida em Dn 12:9. Note-se, entretanto, que apesar da sequência retomada no Apocalipse, o médium João consegue sondar as revelações codificadas pelo símbolo dos “sete trovões” e, quando estava para as anotar, foi interrompido pelo espírito comunicante, que lhe informou sobre a necessidade de “selar’’ ou manter em segredo aquelas informações até o momento em que o sétimo anjo tocasse a trombeta, oportunidade em que o “mistério de Deus” estaria consumado (Ap 10:3-7). Conforme já dito, a sétima trombeta, referida na passagem, anuncia o fim da tribulação, após o julgamento do Grande Dia (Ap 11:15-19), contexto esse que aponta para o período antevisto para a vinda do Espiritismo.








              












A complementaridade entre o livro de Daniel e o Apocalipse de João é especial. Sustentamos que ambos formam a linha principal da revelação. Operam como o “tronco” da mensagem mediúnica de presciência a respeito do futuro da humanidade, na perspectiva de concretização dos ensinamentos de Jesus, enquanto que os livros dos demais profetas (e.g., Isaías, Jeremias, Ezequiel) são “galhos” que preenchem a mensagem, quais enxertos. Dois textos que auxiliam na interpretação desse tronco com seus galhos são a parábola dos lavradores maus (Mt 21:33-46) e o sermão profético (Mt 24:29-31). Funcionam como verdadeiras “lupas” para a leitura do conjunto.





Não se tem por objetivo aprofundar no estudo do livro de Daniel. Do ponto de vista espírita, a melhor abordagem que conhecemos a respeito está na obra O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos, de Wallace S. Oliveira. Dentre outras informações importantes, o relato de Daniel menciona o que deve acontecer no fim dos dias (Dn 2:28), a sequência dos “reinos” que constituem as antecessoras da Grande Babilônia prevista no Apocalipse, o advento e a queda (Dn 2:45, 8:25, 11:19) do desolador (Dn 9:27), assim como pistas a respeito da grande tribulação.

Para o Apocalipse, merece destaque a interpretação de Daniel sobre a estátua compósita visualizada no sonho de Nabucodonosor, rei da Babilônia (Dn 2:37-25). Wallace S. Oliveira considera que “(...) as partes específicas da imagem daquela grande estátua se referiam, na verdade, aos reinos que se sucederiam no tempo (...)”, representando a cabeça o Império Babilônico.[64] Especificamente, a sequência de reinos indicada em Daniel corresponde, pela linha da história, ao (i) Império Babilônico (Dn 2:38), (ii) Império Medo-Persa (Dn 2:39), (iii) Império Greco-Macedônico (Dn 2:39), (iv) Império Romano (Dn 2:40).[65] A última parte da grande estátua interpretada pelo médium Daniel, corresponderia ao quinto reino transitório do planeta. Cuida-se especificamente dos “pés” da estátua, conforme consta em Dn 4:41-45:

“Os pés que viste, parte de argila de oleiro e parte de ferro, designam um reino que será dividido: haverá nele parte da solidez do ferro, uma vez que viste ferro misturado à argila de oleiro. Como os pés são parcialmente de ferro e parcialmente de argila de oleiro, assim esse reino será parcialmente forte e, também, parcialmente fraco. O fato de teres visto ferro misturado à argila de oleiro indica que eles se misturarão por casamentos, mas não se fundirão um com o outro, da mesma forma que o ferro não se funde com a argila. No tempo desses reis o Deus do céu suscitará um reino que jamais será destruído, um reino que jamais passará a outro povo. Esmagará e aniquilará todos os outros reinos, enquanto ele mesmo subsistirá para sempre. Foi o que pudeste ver na pedra que se destacou da montanha, sem que mão alguma a tivesse tocado, e a reduziu a pó o ferro, o bronze, a argila, a prata e o ouro.”



A passagem é densa, repleta de símbolos importantes. Foi abordado, anteriormente, que materiais como madeira, argila, pedra, cobre, estanho, chumbo, prata e ouro são usualmente mencionados nas escrituras para representar insumos empregados por mãos humanas para produzir algo, o que indica as criações artificiais por parte dos homens. Seu sentido para o Apocalipse de João será objeto de comentários pontuais. Conforme se verá, o “casamento” mencionado em Dn 2:43 é fundamental para a compreensão dos vínculos relatados em Ap. 17. Apesar dessa conjugação de interesses inferiores, foi previsto que deste contexto Deus extrairia os elementos para a constituição de um reino imperecível (Dn 2:44), o verdadeiro primado das leis superiores no planeta, que na simbologia do Apocalipse corresponde à Nova Jerusalém. Tudo isso aconteceria no contexto do quinto reino, que é o “grande enganador”, o “grande assolador”.[66] Segundo o excelente estudo de Wallace S. Oliveira:


“(...) o novo assolador (Dn 2:41-43), que é a grande abominação que causará a desolação ou destruição, representava um 5º e novo reino ou poder que surgiria futuramente no mundo, porém com uma característica conflituosa ou uma natureza dupla (Dn 2:41), exercendo o seu poder tanto nas questões materiais (ou temporais, de governo e de política), quanto nas espirituais (ou religiosas), controlando-o, (...) que surgiria após o reinado do Império Romano (...)”.[67]

Complementares ao sonho da estátua compósita, interpretado por Daniel, são as visões deste notável médium conhecidas como a “profecia dos quatro animais e dos reinos” (Dn 7) e a “profecia do carneiro e do bode” (Dn 8). Novamente, não cabe aqui o estudo detalhado dessas manifestações típicas da mediunidade de presciência. Cabe apenas centrar foco no chifre pequeno referido em Dn 7:8, 7:20, 8:9, de aspecto majestoso (Dn 7:20), que proferiria palavras arrogantes (Dn 7:8, 7:11, 7:20) e insultos contra o Altíssimo (Dn 7:25), tornando-se obstáculo aos santos (Dn 7:21, 8:24). A entidade representada pelo símbolo em foco exaltar-se-ia em seu coração (Dn 7:25), teria a pretensão de penetrar os enignas (Dn 8:23) e seria responsável por mudar os tempos e a Lei (Dn 7:25). Este chifre corresponde ao referido “quinto reino”, o institucionalismo religioso romano. Por sua vez, o “quinto reino” surge do “quarto animal” mencionado em Dn 7:7, que representa o Império Romano.[68] A relação entre o quarto animal e o chifre pequeno lembra o que consta em Ez 16:44: “Tal mãe, tal filha”, onde a “mãe” é o Império Romano e a “filha” o institucionalismo religioso romano. O intervalo codificado na fórmula “tempo, tempos e metade de um tempo” (Dn 7:25), também repetido em Ap 12:14, é o período de domínio do quinto reino, a igreja romana[69], o que será estudado adiante.


Esses reinos sucessivos são os montes referidos em Ap 17:9 e, ainda, consistem nas várias “Babilônias”. Antes do Império Babilônico propriamente dito, existiram duas nações icônicas que preenchiam o símbolo, mencionadas em Ap 11:8, designadamente Sodoma e Egito, que são precursoras da “Grande Babilônia”.[70] Curioso notar que Is 13:19 compara a Babilônia à Sodoma. O Apocalipse de João, em seu capítulo 17, tece uma revisão desses impérios simbólicos e os alinha na previsão mediúnica atualizada até o “fim dos tempos”, ou seja, até a Grande Babilônia. O encadeamento das “Babilônias” é renumerado em Ap 17:9-10, de acordo com a seguinte leitura sugerida neste estudo: 1) Sodoma, 2) Egito, 3) Império Babilônico, 4) Império Medo-Persa, 5) Império Greco-Macedônico, 6) Império Romano, 7) Grande Babilônia, território de domínio da besta apocalíptica, 8) Sede institucional da besta apocalíptica, segundo a especial relação entre Grande Babilônia e a prostituta, objeto de comentários tecidos sob Ap 17. O disposto em Ap 17:9,10 serve como teste: do número 1 ao 5 tem-se os cinco “reinos” que caíram antes da existência física de João, o número 6 identifica o império que existia à época da comunicação mediúnica e o número 7 refere-se ao “reinado inferior” futuro. Já foi dito que são coletividades marcadas pelos seus desvios morais[71], que predominam sobre os assuntos temporais e que representam o “círculo dos gentios”, cuja cultura é contrária à “aliança sagrada”. Em linguagem espírita, pode-se dizer que indicam a cultura do materialismo. Com a nota diferencial do especial “casamento” entre a prostituta e a Grande Babilônia (Dn 2:43), ou entre o âmbito religioso-institucional e o âmbito das comunidades que “receberão autoridade como reis por uma hora apenas, juntamente com a Besta” (Ap 17:12, 13). O livro de Daniel, portanto, contribui para o entendimento da linha das “Babilônias” desde Sodoma até a “Grande Babilônia” do Apocalipse. E também para o entendimento de que o institucionalismo religioso surge da sequência de “Babilônias”, destacando a mácula da inferioridade humana sobre os ensinamentos espirituais superiores (= vinho puro), o que resulta na deturpação dos ensinamentos (= vinho misturado).

IX - A divisão do Apocalipse


No tocante ao parâmetro semântico, o texto do Apocalipse tem recebido várias propostas de divisão. Nesta oportunidade será abordada uma delas, escolhida por permitir uma compreensão panorâmica do conteúdo da revelação. Considerando-se a narrativa circular do livro, que gira em torno de temas, às vezes repetindo-os com aprofundamentos diversos, os capítulos podem ser divididos da seguinte maneira:


1 – Ap 4-10 – Previsões gerais. Nesta parte o texto apresenta a síntese do período objeto do Apocalipse, desde os anos que se seguiram à morte de João até a concretização do paradigma de mundo ditoso (= reino do céu). Entre os pontos abordados, destacam-se: (i) a direção divina sobre os rumos no planeta; (ii) o anúncio da grande tribulação, (iii) o anúncio da vitória, que significa a definitiva concretização, entre os homens, das leis maiores, (iv) a purificação da realidade humana, sobretudo do ângulo espiritual, representada pela ação do simbólico turíbulo, (v) a manifestação de advertências gerais, em virtude dos desvios morais;

2 – Ap 11-17 – O período da grande tribulação. Neste trecho são aprofundados aspectos da grande tribulação. Entre os pontos principais encontram-se: (i) a prostituta e sua atuação pontual, (ii) a Grande Babilônia e sua participação, (iii) o dragão e sua ação, (iv) o julgamento dos agentes responsáveis pela grande tribulação, (v) a concretização da purificação, (vi) o advento do Espiritismo;

3 – Ap 18-20 – A dissolução dos principais agentes da grande tribulação. O intervalo em destaque apresenta a extinção da prostituta, da Grande Babilônia e do dragão. Igualmente, reforça a atuação do Espiritismo;


4 – Ap 21-22 – A concretização dos ensinamentos de Jesus. A essência da profecia é o testemunho de Jesus (Ap 19:10) e a mediunidade de João anteviu a concretização dos ensinamentos do Mestre no planeta. O trecho aborda (i) a efetivação do Reino de Deus e (ii) a renovação da humanidade, pela figura da Nova Jerusalém.







Através deste resumo já é permitido constatar que o Apocalipse é muito mais enxuto do que se geralmente se concebe, no que diz respeito aos temas que constituem seu objeto.

X - Algumas dicas interpretativas de Emmanuel no livro A Caminho da Luz


O livro A Caminho da Luz, ditado pelo espírito Emmanuel para Francisco Cândico Xavier, cobre o mesmo período abrangido pela Bíblia, a abranger o surgimento das raças adâmicas até o reajustamento de todos os valores humanos.

As informações trazidas por Emmanuel constituem, assim, dicas preciosas para a leitura do Apocalipse. Tanto é que no Capítulo 14 desta obra consta item específico sobre o Apocalipse de João. Ali é revelado que no final do primeiro século os espíritos tutelares do planeta já puderam antever “a situação amargurosa do mundo, em face do porvir.”[72] E, por isso, sob a direção de Jesus foram estabelecidas “novas linhas de progresso para a civilização.”[73] O texto é revelador quanto ao fato de a espiritualidade superior já não ter alimentado esperanças a respeito da comunidade romana, comparada ao um foco infeccioso que precisava ser neutralizado ou removido.[74] Ou seja, Roma já se apresentava, desde aquela época, como toco resultante da poda da árvore do Evangelho, que foi mantido na terra com suas raízes e cadeias de ferro e de bronze (Dn 4:12, 4:20).

De acordo com o livro A Caminho da Luz, João é chamado em espírito perante Jesus, que lhe entrega seus conhecimentos ao planeta “como advertência a todas as nações e povos da Terra.”[75] Aqui a dica interpretativa manifesta o sentido inegavelmente coletivo das admoestações extraordinárias do Apocalipse.

Na sequência, a obra em análise apresenta uma dica que é, na verdade, um delimitador temporal para a leitura da revelação:

“Todos os fatos posteriores à existência de João estão ali previstos. É verdade que frequentemente a descrição apostólica penetra o terreno mais obscuro; vê-se que a sua expressão humana não pode copiar fielmente a expressão divina das suas visões de palpitante interesse para a história da Humanidade.”[76]

Importante frisar, pois, que de acordo com Emmanuel o Apocalipse contém mediunidade de presciência sobre fatos posteriores à existência física de João.

Além disso, Emmanuel fornece pistas que auxiliam a identificar o âmbito material do Apocalipse, ou seja, os assuntos que subjazem aos seus símbolos:

“As guerras, as nações futuras, os tormentos porvindouros, o comercialismo, as lutas ideológicas da civilização ocidental, estão ali pormenorizadamente entrevistos. E a figura mais dolorosa, ali relacionada, que ainda hoje se oferece à visão do mundo moderno, é bem aquela da igreja transviada de Roma, simbolizada na besta vestida de púrpura e embriagada com o sangue dos santos.”[77]

Surpreendendo aqueles que concebiam a impossibilidade de identificação da besta apocalíptica, Emmanuel abre um item com esse propósito no mesmo Capítulo em foco, oportunidade em que aduz:

“Reza o Apocalipse que a besta poderia dizer grandezas e blasfêmias por 42 meses, acrescentando que o seu número era o 666 (Apoc. XIII, 5 e 18). Examinando-se a importância dos símbolos naquela época e seguindo o rumo certo das interpretações, podemos tomar cada mês como sendo de 30 anos, em vez de 30 dias, obtendo, desse modo, um período de 1260 anos comuns, justamente o período compreendido entre 610 e 1870, da nossa era, quando o Papado se consolidava, após o seu surgimento, com o imperador Focas, em 607, e o decreto da infalibilidade papal com Pio IX, em 1870, que assinalou a decadência e a ausência de autoridade do Vaticano, em face da evolução científica, filosófica e religiosa da Humanidade.”[78]

Percebe-se, então, que Emmanuel situa o período de 1260 anos enquanto predomínio da besta apocalíptica, entre o intervalo de 610  - consolidação do papado - até o decreto da infalibilidade papal, em 1870. Chega-se ao período de 1260 anos pela equação apocalíptica de “tempo, tempos e metade de um tempo”, numericamente identificado em Ap 11:3 e Ap 12:6, e que também pode ser obtido pela equação de x + 2x+ 1/2x, equivalente a 3,5x. O raciocínio é simples. O ano apocalíptico deve ser considerado constituído por meses arredondados de 30 dias cada. Assim, 12 meses correspondem a 360 dias. Por sua vez, a substituição de variável “x” por de 360 dias resulta, conforme a equação acima, em 1260 dias (360 multiplicado por 3,5). Nessa linha, 42 meses correspondem a 1260 dias proféticos, que por sua vez são 1260 anos.

Emmanuel apresenta informações relevantíssimas nesta e em outras obras. Para a presente síntese, importa anotar que o mentor de Francisco Cândido Xavier fornece uma informação que acolhemos na condição de dica sobre o interregno entre a grande tribulação e o surgimento da humanidade regenerada (a Nova Jerusalém), contida no Capítulo 25 da obra A Caminho da Luz, intitulado “O Evangelho e o Futuro”:

“Vive-se agora, na Terra, um crepúsculo, ao qual sucederá profunda noite; e ao século XX compete a missão do desfecho desses acontecimentos espantosos. (...)
Sim, porque depois da treva surgirá uma nova aurora. Luzes consoladoras envolverão todo o orbe regenerado no batismo do sofrimento.”[79]

Oportunamente, demonstraremos que o Espiritismo representa, também em virtude da situação topológica indicada nas escrituras, o desfecho do período da grande tribulação, e sua consolidação se deu no século XX. A profunda noite, referida na passagem, diz respeito ao período de transição que pelo qual passamos, estabelecido entre o fim da grande tribulação e o início da “nova aurora” (= regeneração rumo ao mundo ditoso, a Nova Jerusalém). O que se diz sobre esse período? No momento adequado será comentado o que o Apocalipse e a revelação espírita podem nos acrescentar, na linha da mediunidade de presciência. Para fins de reflexão cabe levar em consideração que nesse intervalo a humanidade tateia em meio às sombras compactas, paralelamente aos efeitos da grande tribulação e, ainda, acompanhada da “vinha de luz” concedida por Deus para esse último período, que é o Espiritismo.






______________________________________________________

[1] MIRANDA, Neemias Carvalho. Apocalipse – comentário versículo por versículo. Curitiba: AD Santos, 2013, p. 195. O autor apresenta esse sentido em contexto diverso do que sustentamos neste estudo.
[2] WALTKE, Bruce K. Comentário do Antigo Testamento - Gênesis. São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2013, p. 57.
[3] WALTKE, Bruce K. Comentário do Antigo Testamento - Gênesis. São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2013, p. 57. “Abraão e os demais heróis da fé, em Gênesis – Isaque, Jacó, José e Judá , constituem a raiz santa da qual o Senhor Jesus Cristo brota, e a cuja árvore os gentios haverão de ser enxertados (Rm 11.17-21). Abraão é o pai de todos os que crêem (Rm 4.16, 17).” (WALTKE, Bruce K. Comentário do Antigo Testamento - Gênesis. São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 2013, p. 233).
[4] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 87.
[5] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 57, 60, 61.
[6] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 163.
[7] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 58.
[8] UNGER, Merril F. The New Unger’s Bible Dictionary.3. ed. Chicago: Moody Press, 2009, p. 1749.
[9] XAVIER, Francisco Cândido. Justiça Divina. 1. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2000, Cap. 15.
[10] XAVIER, Francisco Cândido. Rumo Certo. 1. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1971, Cap. 14.
[11] ALISSON, Dale. The End of the Ages Has Come: An Early Interpretation of the Passion and Resurrection of Jesus. Eugene: Wipf and Stock Publishers, 2ª ed., 2013, p. 24.
[12] EVANS, Craig A. The Historical Jesus – Critical Concepts In Religious Studies, Vol. 1. 1ª ed. London: Routledge, 2004, p. 224
[13] UNGER, Merril F. The New Unger’s Bible Dictionary.3. ed. Chicago: Moody Press, 2009, p. 397, 1557, 1749.
[14] HENDRIKSEN, William. Comentario Al Nuevo Testamento – Exposición del Evangelio según San Lucas. Grand Rapids: Libros Desafío, 1ª ed., 2009, p. 286.
[15] UNGER, Merril F. The New Unger’s Bible Dictionary.3. ed. Chicago: Moody Press, 2009, p. 1749.
[16] UNGER, Merril F. The New Unger’s Bible Dictionary.3. ed. Chicago: Moody Press, 2009, p. 1462. WRIGTH, Nicholas Thomas. Evil and the justice of God. Downers Grove: InverVarsity Press, 1ª ed., 2006, p. 55.
[17] KOVACS, Judith; ROWLAND, Christopher. Revelation: the apocalypse of Jesus Christ.1. ed. Malden: Blackwell Publishing, 2004, p. 175.
[18] KEENER, Craig S. The IVP Bible Background Commentary – New Testament. 2. ed. Downers Grove: InterVarsity Press, 2014, p. 745.
[19] TOMLINSON, Lee G. The Wonder Book Of The Bible – a Commentary On The Book of Revelation. Joplin: College Press, 1963, 1ª ed, p. 111.
[20] KEENER, Craig S. The IVP Bible Background Commentary – New Testament. 2. ed. Downers Grove: InterVarsity Press, 2014, p. 745.
[21] KOVACS, Judith; ROWLAND, Christopher. Revelation: the apocalypse of Jesus Christ.1. ed. Malden: Blackwell Publishing, 2004, p. 104.
[22] UNGER, Merril F. The New Unger’s Bible Dictionary.3. ed. Chicago: Moody Press, 2009, p. 1749.
[23] KARDEC, Allan. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos | 1868. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004, p. 449 (Epidemia da Ilha Maurício).
[24] KARDEC, Allan. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos | 1866. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004, p. 405 (Instruções dos espíritos. Sobre a regeneração da Humanidade).
[25] KARDEC, Allan. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos | 1866. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004, p. 410 e ss. (Instruções dos espíritos. Sobre a regeneração da Humanidade).
[26] COLLINS, Adela Yarbro. The Combat Myth in The Book of Revelation. Missoula: Scholars Press, 1ª ed., 1976, p. 34. OSBORNE, Grant R. Apocalipse: comentário exegético. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2014, p. 462, 468.
[27] ALISSON, Dale. The End of the Ages Has Come: An Early Interpretation of the Passion and Resurrection of Jesus. Eugene: Wipf and Stock Publishers, 2ª ed., 2013, p. 24.
[28] ALISSON, Dale. The End of the Ages Has Come: An Early Interpretation of the Passion and Resurrection of Jesus. Eugene: Wipf and Stock Publishers, 2ª ed., 2013, p. 25.
[29] TEMPLE, P. G. Understanding Daniel And The Revelation – A simplified verse by verse explanation of the Prophesy. 2ª ed. Beersheba Springs: Harvestime Books, 2011, p. 182.
[30] KARDEC, Allan. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos | 1866. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004, p. 405 (Instruções dos espíritos. Sobre a regeneração da Humanidade).
[31] XAVIER, Francisco Cândido. Boa Nova. 20. ed. Brasília: FEB, 2000, cap. 5.
[32] XAVIER, Francisco Cândido. Boa Nova. 20. ed. Brasília: FEB, 2000, cap. 30.
[33] XAVIER, Francisco Cândido. Boa Nova. 20. ed. Brasília: FEB, 2000, cap. 3. Palavras do próprio Cristo.
[34] XAVIER, Francisco Cândido. Instrumentos do Tempo. São Bernardo do Campo: GEEM, 1974, Cap. 38.
[35] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 116.
[36] XAVIER, Francisco Cândido. Pontos e Contos.10. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006, Cap. 2.
[37] XAVIER, Francisco Cândido. O Evangelho por Emmanuel: comentários ao Evangelho segundo Mateus. Brasília: FEB, 2017, p. 78. Comentário a Mt 5:9, mensagem “Na grande transição”.
[38] XAVIER, Francisco Cândido. O Evangelho por Emmanuel: comentários ao Evangelho segundo Mateus. Brasília: FEB, 2017, p. 78. Comentário a Mt 5:9, mensagem “Na grande transição”.
[39] “Anche se questa descrizione della caduta di Gerusalemme deriva dagli eventi verificatisi realmente nell'anno 70 d.C., il suo significato sta più in profondità.” (KARRIS, Robert J. In: BROWN, Raymond E.; FITZMYER, Joseph A.; MURPHY, Roland E. Nuovo Grande Commentario Biblico.2. ed. Brescia: Queriniana, 2002, p. 929).
[40] XAVIER, Francisco Cândido. O Evangelho por Emmanuel: comentários ao Evangelho segundo Lucas. Brasília: FEB, 2016, p. 273.
[41] DE VILLIERS, Pieter Gideon Retief. The Sixth Seal in Revelation 6:12-12. In: Acta Theologica Supplementum, v. 6. Bloemfontein: University of the Free State, 2004, p. 5. O próprio quiasma, como se verá adiante, é construído sobre a repetição de alguns termos-chave (HROBON, Bohdan. Ethical Dimension of Cult in the Book of Isaiah. Berlim: Walter de Gruyter GmbH & Co, 2010, p. 141).
[42] BÍBLIA – Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2017, p. 37.
[43] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 163.
[44] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 68.
[45] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 68.
[46] KALIMI, Isaac. The Reshaping of Ancient Israelite History in Chronicles. Winona Lake: Eisenbrauns, 2005, p. 215, 216.
[47] FABRI, Heinz-Joseph. Grande Lessico Dell’Antico Testamento, vol. V. Brescia: Paideia Editrice, 2005, p. 363.
[48] KEENER, Craig S. The IVP Bible Background Commentary – New Testament. 2. ed. Downers Grove: InterVarsity Press, 2014, p. 779.
[49] LUND, Nils Wilhelm. Chiasmus in the New Testament: a study in the form and function of chiastic structures. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2012, p. 5.
[50] KALIMI, Isaac. The Reshaping of Ancient Israelite History in Chronicles. Winona Lake: Eisenbrauns, 2005, p. 215, 216.
[51] KALIMI, Isaac. The Reshaping of Ancient Israelite History in Chronicles. Winona Lake: Eisenbrauns, 2005, p. 215, 216.
[52] WALSH, Jerome T. Style & Strccture in Biblical Hebrew Narrative. Collegeville: Minnesota, 2001, p. 25. KRAŠOVEC, Jože. Antithetic Structure in Biblical Hebrew Poetry. Leiden: E.L. Brill, 1984, p. 13.
[53] HROBON, Bohdan. Ethical Dimension of Cult in the Book of Isaiah. Berlim: Walter de Gruyter GmbH & Co, 2010, p. 109.
[54] DE VILLIERS, Pieter Gideon Retief. Prime evil and its many faces in the Book of Revelation. In: Neotestamentica, Vol. 34, Potchefstroom: New Testament Society of Southern Africa, 2000, p. 75.
[55] DE VILLIERS, Pieter Gideon Retief. Prime evil and its many faces in the Book of Revelation. In: Neotestamentica, Vol. 34, Potchefstroom: New Testament Society of Southern Africa, 2000, p. 75.
[56] SIEW, Antoninus King Wai. The war between the two beasts and the two witnesses – a chiastic reading of Revelation 11.1-14.5. London: T&T Clark, 2005, p. 212. HEIL, John Paul. Hebrews: chiastic structures and audience response. Washington: The Catholic Biblical Association of America, 2010, p. 2. LIM, Bo H. The “Way of The Lord” in The Book of Isaiah. New York: T & T Clark, 2010, p. 31.
[57] SIEW, Antoninus King Wai. The war between the two beasts and the two witnesses – a chiastic reading of Revelation 11.1-14.5. London: T&T Clark, 2005, p. 211. WALSH, Jerome T. Style & Strccture in Biblical Hebrew Narrative. Collegeville: Minnesota, 2001, p. 13.
[58] STEFANOVIC, Ranko. Revelation of Jesus Christ – Commentary on the Book of Revelation.1. ed. Berrien Springs:Andrews University Press, 2002, p. 35.
[59] GONZALEZ, Eliezer. A estrutura de Apocalipse 10:11-11:18. In: Kerygma, Vol. 9, nº 2. Engenheiro Coelho: Centro Universitário Adventista de São Paulo — Unasp, 2013, p. 13-26
[60] Tradução livre de “Among the texts that for good reasons can be classified as apocalypses, only the book of Daniel manifests such an attempt.” (COLLINS, Adela Yarbro. Cosmology & Eschatology in Jewish & Christian Apocalypticism. 1. ed. Leiden: E.L. Brill, 1996, p. 58).
[61] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 83.
[62] “This principle of unity and complementarity of the two testimonies is all the more significant in that it constitutes the bases of how to interpret the Apocalypse. Without the book of Daniel, the Apocalypse remais obscure, not only in virtue of its numerous allusions and references to Daniel, but also because it shares the same perspective and uses the same language, symbols, and accounts of the same prophetic events.” (DOUKHAN, Jacques. Secrets of Revelation: The Apocalypse Through Hebrew Eyes.1. ed. Hagerstown: Review and Herald Publishing Association, 2002, p. 96, 97).
[63] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 42.
[64] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 64, 65.
[65] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 65, 76, 77.
[66] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 79, 143.
[67] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 69.
[68] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 131, 143.
[69] OLIVEIRA, Wallace S. O Sermão Profético de Jesus – uma visão espírita do final dos tempos. São Paulo: Livrus, 2017, p. 132.
[70] DE VILLIERS, Pieter Gideon Retief. The Lord was crucified in Sodom and Egypt. Symbols in the Apocalypse of John. In Neotestamentica: Journal of the New Testament Society of South Africa. Johannesburg: NTSSA, Vol. 22, 1988, p. 134.
[71] STEFANOVIC, Ranko. Revelation of Jesus Christ – Commentary on the Book of Revelation.1. ed. Berrien Springs:Andrews University Press, 2002, p. 346.
[72] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 116.
[73] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 116.
[74] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 116.
[75] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 116.
[76] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 117.
[77] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed.  Brasília: FEB, 2013, p. 117.
[78] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed. Brasília: FEB, 2013, p. 117. No mesmo sentido, ver SCHUTEL, Cairbar. Interpretação sintética do Apocalipse. 6. ed. Matão: Ed. Casa Editora O Clarim, 2004, p. 54.
[79] XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. 38. ed. Brasília: FEB, 2013, p. 117. No mesmo sentido, ver SCHUTEL, Cairbar. Interpretação sintética do Apocalipse. 6. ed. Matão: Ed. Casa Editora O Clarim, 2004, p. 202, 203.

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